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REVISTA DO BRASIL
VIII

A este passaro audaz, de ébano á côr das pennas,
Grave na compostura e na physionomia,
Que ao cerebro me dava idéas mais serenas,
Que me acalmava o peito, e a sorrir me induzia,

Voltando-me disse eu: "Tu que te não enscenas
De altas cristas ou poupa á negra frontaria.
Velho corvo feral que te mostras apenas,
Certo, não és o vil núncio da covardia.

Corvo! antigo viajór que das regiões da noite
Partiste a procurar um tecto que te açoite,
Dize-me tu quaes são teus titulos reaes!

Qual a patria ante a qual teu orgulho se ufana?
Quaes as tuas regiões na noite plutoneana?...
E o corvo senhorial respondeu: "Nunca mais!!..."

IX

Ao perceber assim que a ave me comprehendia
E que dava resposta a esta pergunta estranha,
Que eu, entre espanto e medo, a medo lhe fazia,
Senti, de pasmo, n'alma um peso de montanha.

Porque ainda quem tenha uma intuição tamanha,
Capaz de perceber o que outrem mal veria,
Certo, não achará neste dedalo um guia
Para o tirar do cháos em que a alma se emmaranha!

Ninguém verá como eu, a ave negra num busto,
Sem que a mova o receio e sem que a mova o susto,
Tranquilla espreguiçando as azas triumphaes,

Ouvir a minha voz a lhe indagar o nome
E ante a curiosidade atroz que me consome,
Dizer-me simplesmente a phrase: Nunca mais!...