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REVISTA DO BRASIL

desprevenidos. Só ficou no cemiterio o orador besouro, luctando para desarrolhar-se afim de concluir a leitura do discurso.

Teimava em falar, o ladrão! E tanto fez que arrancou o batoque e proseguiu na lenga-lenga :

— Mont'Alverne já disse que...

Mas aconteceu que suas palavras despertaram um sapo que cochilava ali por perto. O sapo olhou-o bem, ouviu um pedacinho do discurso, deu uma risada velhaca, e disse lá com as suas pintas:

— Eu já te curo, meu pedante...

E approximando-se devagarinho, — nhoc! — enguliu o orador com sobrecasaca, discurso, cartola e tudo.

Bem feito. Assim houvesse um sapo para cada orador cacete!...

A PESCARIA DE EMILIA



ACABARAM-SE afinal as jaboticabas. Somente nos galhos bem lá do alto é que inda se via uma ou outra, furadinha de vespa. O leitão rabicó — ron, ron, ron — volta e meia dava seu gyro por alli ficando parado bons minutos, muito serio, á espera de que cahisse alguma. Narizinho tambem veiu e lá estava de vara na mão e nariz arrebitado para o ar sondando a arvore, quando a tia Anastacia, de passagem para o rio, com a bacia de roupa á cabeça, lhe gritou de longe:

— Arre, menina! Não chegou uma semana inteira de tloc, tloc? Largue disso e venha me ajudar a estender roupa no córador.

Narizinho jogou a vara em cima do leitão, que fez coin! — e foi correndo para o rio, com a Emilia de cabeça para baixo no bolso do avental.

Lá chegando teve uma idéa: deixar a boneca pescando emquanto cuidavam da roupa. Poz o dedinho na testa, reflectiu e disse:

— Tia Nastacia é capaz de me fazer um anzolzinho de alfinete para a Emilia? A pobre está secca de vontade de pescar!...

A negra balançou a cabeça: — Sim, senhora! Era só o que faltava!...