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LUCIA
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— Faz? insistiu a menina. Alfinete, aqui tenho um. Linha, ha alli no alinhavo do meu vestido novo. Vara não falta. Faz?

A negra não teve remedio.

— Como é que não hei de fazer, demoninho? Faço, sim...

E fez. Dobrou o alfinete em forma de anzol, encastroou-o na linha do alinhavo, atou a linha na ponta de uma vara e amarrou a vara ao braço da boneca.

—E isca, como é? perguntou a menina?

— Isca é o de menos. Qualquer gafanhotinho serve.

Narizinho, salta d'aqui, salta d'alli, conseguiu logo apanhar na grama um grilo verde. Espetou-o no anzol. Em seguida, arrumando a boneca á beira d'agua, muito tesa, com uma pedra ao collo para não cahir, disse-lhe:

— Agora, dona Emilia, bico calado, hein? Nem um pio sinão me espanta a peixaria. E logo que beliscar — zuqt! — um puxão na linha !

E deixou-a lá indo ter com a preta.

— Você me assa hoje mesmo os peixinhos que a Emilia apanhar?

A preta riu-se, riu-se...

— Asso, sim, minha filha, asso até no dedo!...

— Não caçôe, tia Nastacia, não caçôe da Emilia... Ninguem imagina quem é aquella sonsa. Emilia é uma damnada!

Palavras não eram dictas e — tchibun! — a pescadora de panno, com pedra e tudo, revirou para dentro d'agua.

— Acuda, Nastacia! grita Narizinho. Acuda que a Emilia se afoga!...

Um peixe havia engulido a isca, e luctando para safar-se do anzol, arrastava com a piracuara para o meio do rio.

Narizinho, cada vez mais afflicta,

— Acuda! Depressa!... gritava, com desespero, vendo a Emilia rodar pela correnteza abaixo.

Tia Anastacia arranjou uma vara de gancho e com muito geito foi arrastando para a beira do corgo a pescadora infeliz, até chegar em ponto onde a menina pudesse agarral-a.