perdição irreparável! Agarrou o açoite – e, despindo a túnica furiosamente, açoitou a carne infectada de gula.
Mas logo os primeiros golpes, em lugar de o ferirem, lhe deram o incompreensível, estranho gosto de uma carícia. Era como se braços nus se colassem ao seu corpo nu. Arrojou de si o azorrague, num imenso terror: –e as negras tiras de couro tomaram, caídas sobre a rocha, a forma redonda e branca de braços cansados, que se estiram. Caiu de joelhos – e de joelhos, diante dele, estava uma figura, uma mulher, cujos olhos muito negros, cujos lábios muito escarlates, transpareciam através do véu que ela apertava contra o seio com os braços redondos, cheios de frescura e de aroma...
Então, longos dias, não comeu, não bebeu – e nunca foi mais dolorosa e furiosa a sua luta com o grande Inimigo. Torturado pela fome, torturado pela sede, a cada instante Onofre encontrava diante de si uma larga mesa, com uma resplandecente toalha de linho, coberta de todas as delícias da cozinha, do pomar e da adega, carnes que fumegavam com um aroma rico, legumes que, de tenros e bem cozidos, se desfaziam dentro do seu molho transparente, montes de frutas cuja polpa suculenta estalava de madura, frascos com vinho cor de ametista e cor de ouro, esfriando entre blocos de gelo que reluziam.