onde nascera. Então, para mais completamente se humilhar, e nada reter da humanidade superior, que não merecia, decidiu igualizar o seu corpo ao do bruto – e penetrar de rastos na Penitência e no Deserto. Arrojou o bordão, despiu o saio de lã, atirou as mãos sobre a areia, e começou a caminhar de rojo, lentamente, entre a erva já rara e amarelada, como uma alimária ferida.
Toda a verdura findara e só havia agora terra seca – a planície arenosa, coberta de um rubor matutino, estendendo-se às montanhas líbicas, que pareciam de um mármore fino e cor-de-rosa. Onofre avançava, orando, gemendo, com a longa barba a arrastar. A espaços, parava, não para repousar, mas para descobrir na areia os sulcos que os seus joelhos pesadamente cavavam – e sentir bem, nesse rasto de fera, a imensidade da sua abjecção. E se avistava seixos aguçados ou uma pedra áspera, por sobre elas se empurrava, para abater, pela dor da carne débil, a rebelião da alma soberba. Já a sede o devorava, e bebia, com avidez e gosto, as lágrimas grossas que lhe arrancavam as saudades dos seus anos de paz e pureza.
O dia ia em meio: todo o deserto refulgia, lívido, de uma horrível secura. As montanhas, ao longe, na tremura do ar quente, eram amarelas – e só havia, em toda a extensão, silêncio, solidão e sol.