frade mendicante que lhe dava uma relíquia a beijar, algum pobre menestrel, que, a troco de um maravedi, lhe cantava um vilancete, ou a gente dos arredores, lavradores e mesteirais, que todos o conheciam e lhe diziam, com agrado: «Deus salve o Senhor D. Gil». E bem depressa abandonou estas cavalgadas solitárias – passando os dias no solar, pela quinta, com um látego inútil na mão, a visitar as cavalariças, o telheiro, onde os falcões engordavam entorpecidos, o lagar ou a eira. Na grande sala, D. Rui, que ia embranquecendo, dormitava, já muito gordo e pesado, na sua alta cadeira de carvalho, com os pés numa grande almofada, as mãos cruzadas e escondidas, como as de um padre, nas mangas da sua simarra. D. Tareja, com o cabelo todo branco, sentada numa esteira rio chão, trabalhava entre as aias; – e todas as noites Frei Múnio recomeçava a batalha de Dano, ou os milagres de Santa Úrsula.
Às vezes, seguido só do seu alão, D. Gil descia através da aldeia a uma pequena casa, junto do rio, onde Mestre Porcalho, muito velho também, enriquecido pelos dons de D. Rui, se retirara a repousar, cultivando o seu horto.
Encontrava sempre o douto velho, com os seus longos cabelos brancos, muito compridos, soltos sobre a garnacha negra, cuidando do cebolinho, do feijoal – ou à mesa da cozinha,