profundo silêncio; nela motivavam-no a surpresa, o terror, o desgosto, que lhe causavam a fisionomia desse homem de tão sinistro olhar: nele, a deleitável contemplação desse rosto feminil de tão pura e ideal beleza.
E assim permaneceram, ela a recobrar coragem para escapar a esse desconhecido que a incomodava; ele a contemplar-lhe as negras tranças molemente reclinadas sobre uns ombros de marfim, as mãos diáfanas e mimosas, que lhe velavam o rosto, que divisava ser belo como o rosto angélico de um querubim.
Por fim, a moça desembaraçou de entre as mãos as faces cândidas e aveludadas, e olhou em cheio, com horror e com desdém para o seu mudo companheiro. Assim desdenhoso esse rosto, que ainda tão vivamente se ressentia das comoções por que havia passado o coração, era ainda mil vezes mais belo.
E esse olhar tão expressivo, o desconhecido sentiu que queria dizer-lhe:
— Ide-vos!
Ele embalde tentou obedecer a essa ordem muda de um ente tão divino, qual jamais havia visto; mas quem sabe se o coração lho permitia?
Estranho foi o que se passou então em sua alma, e ele sentiu que alguma coisa lhe abalava o fundo do peito; gemeu de um primeiro afeto, e curvou-se ao ímpeto de uma paixão insensata.
E o instrumento mortífero estava-lhe nas mãos, e ele o não via, porque seus olhos estavam fitos sobre a encantadora donzela: mas ela o viu, estremeceu, e um novo grito lhe prorrompeu dos lábios.
Úrsula ia fugir.