Hora Fatal
(A TH. PEREIRA)

Leonio, um bello e guapo rapaz, intelligente e rico, commettera um crime.

Jámais lhe passára pela mente que havia de ser divulgado o seu tremendo delicto.

Quando já era passado algum tempo desd'a epoca do facto, em tão funesta contingencia praticado, e de cujas consequencias elle se aproveitava, a bom regalo, foi o marreco seguro sem oppôr a minima resistencia.

E para que resistir? não tinha elle tão imprudentemente saciado seu maligno desejo, na perigosa fonte de espantoso crime ?

Luctar agora contra as garras que o seguravam — Seria mais e mais se comprometter.

Louco, sob a influencia pertinaz de diabolica tentação, fraquejára o misero, em vez de sopitar as ardencias que o arrastavam para a culpa.

Justo, pois, o castigo que lhe inflingiam, a elle o malvado ladrão, de faro. astuto e fino...

Um côro dissonante de cem vozes atordoava, em ameaça feroz, os ouvidos do infeliz delinquente, alli bem vigiado em rispido circulo de guardas sequiosos de vingança.

Apressára-se o julgamento de Leonio : inexoraveis juizes, em demorado discutir, haviam proferido o solemne veredictum, condemnando-o.

Pobre e inditoso moço !

A sorte quizera que, na phase em gue a vida nos offerece o que de bom possue, elle cahisse ás mãos de um carrasco deshumano e brutal.

Dasappareciam, como o piscar intermittente do corisco atravez do sideral zimborio, os milhões de segundos que o separavam da hora fatal do supplicio.

Infimo punhado de tempo a mediar entre a vida e a morte do desgraçado mancebo !

Chegára o tremendo instante...Chôros e abraços e lamentos, acompanhados de malignas risotas desfarçadas : eis o prologo do drama cujo desfecho ia se ver.

Radiosa e meiga appareceo no local do sacrificio — grande salão fidalgo profusamente iluminado — a victima do condemnado Leonio.

O algoz de negra sotaina e alvissima, rendada sobre-peliz revestido, consummára já a execução, enlaçando a dextra do réu confesso á aristocratica mão de sua gentil noiva, sob a macia seda da estola sacerdotal.

O espantoso crime de Leonio fora roubar um coração — o mimoso e delicado coração de Aldehilde — e por isso casadinho estava.

1892.


Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.


Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.