—O sr. Pires?
—Foi à Secretaria de Justiça.
—Demora-se?
—Não sei.
Luís da Costa olhou para o major ao ouvir estas palavras do criado do sr. Pires. O major disse fleumaticamente:
—Vamos à Secretaria de Justiça.
E ambos foram a trote largo na direção da Rua do Passeio. Iam-se aproximando as três horas, e Luís da Costa, que jantava cedo, começava a ouvir do estômago uma lastimosa petição. Era-lhe, porém, impossível fugir às garras do major. Se o Pires tivesse embarcado para Santos, é provável que o major o levasse até lá antes do jantar.
Tudo estava perdido.
Chegaram enfim à Secretaria, bufando como dois touros. Os empregados vinham saindo, e um deles deu a notícia certa do esquivo Pires; disse-lhe que saíra dali, dez minutos antes, num tílburi.
—Voltemos à Rua dos Pescadores, disse pacificamente o major.
—Mas, senhor...
A única resposta do major foi dar-lhe o braço e arrastá-lo na direção da Rua dos Pescadores.
Luís da Costa ia furioso. Começava a compreender a plausibilidade e até a legitimidade de um crime. O desejo de estrangular o major pareceu-lhe um sentimento natural. Lembrou-se de ter condenado, oito dias antes, como jurado, um criminoso de morte, e teve horror de si mesmo.
O major, porém, continuava a andar com aquele passo rápido dos majores que andam depressa. Luís da Costa ia rebocado. Era-lhe literalmente impossível apostar carreira com ele.
Eram três e cinco minutos quando chegaram defronte do escritório do sr. Pires. Tiveram o gosto de dar com o nariz na porta.
O major Gouveia mostrou-se aborrecido com o fato; como era homem resoluto, depressa se consolou do incidente:
—Não há dúvida, disse ele, iremos à Praia Grande.
—Isso é impossível! clamou Luís da Costa.
—Não é tal, respondeu tranqüilamente o major, temos barca e custa-nos um cruzado a cada um: eu pago a sua passagem.
—Mas, senhor, a esta hora...
—Que tem?
—São horas de jantar, suspirou o estômago de Luís da Costa.
—Pois jantaremos antes.
Foram dali a um hotel e jantaram. A companhia do major era extremamente aborrecida para o desastrado alvissareiro. Era impossível livrar-se dela; Luís da Costa portou-se o melhor que pôde. Demais, a sopa e o primeiro prato foram o começo da reconciliação. Quando veio o café e um bom charuto, Luís da Costa estava resolvido a satisfazer seu anfitrião em tudo o que lhe aprouvesse.
O major pagou a conta e saíram ambos do hotel. Foram direitos à estação das barcas de Niterói; meteram-se na primeira que saiu e transportaram-se à imperial cidade.
No trajeto, o major Gouveia conservou-se tão taciturno como até então. Luís da Costa, que já estava mais alegre, cinco ou seis vezes tentou atar conversa com o major; mas foram esforços inúteis. Ardia entretanto por levá-lo até a csa do sr. Pires, que explicaria as coisas como soubesse.