Se cuidais que sois senhora

Se cuidais que sois senhora,
Ventura estais enganada,
Que já sei que não sois nada.

Este nome que vos dão,
Foi derribado do vento,
Sois um mar no movimento,
Sois uma grã confusão.
Não tem força vossa mão,
Não vivais mais enganada,
E sabei que não sois nada.

Os casos que acontecem,
Prósperos ou desastrados,
Uns vêm por culpa dos fados,
Outros porque se merecem.
Os que esta razão conhecem,
Dirão que vós não sois nada,
Ou que sois cousa sonhada.

Com vossos prometimentos,
Muito despidos da verdade,
Vai-se consumindo a idade,
Também os merecimentos.
Armais castelos de ventos,
E no cabo da jornada,
Vem tudo fundir em nada.

Se cuidais que sois senhora,
Ventura estais enganada,
Que já sei que não sois nada.

Sois uma opinião,
Em que não há fundamento.
Sois um acontecimento,
Que vem fora de razão.
Sois um pensamento vão,
Em vida desesperada.
Já vereis que não sois nada.

Quem vos ouvir nomea…
Cuidará que sois alguém,
E vós sois um pouco…
Que nenhuma forma tem,
Pois vos nunca viu ning[uém.]
De quem sereis nomead[a,]
Senão dos que sabem na[da?]