XLVI

Dezembro 1871.

É curioso! Que tendes vós, o patriotas, com a casa de Saboia? Desde que possuimos entre nós uma pessoa da casa de Saboia, todo o partido des. peitado, todo o ministro demittido, todo o regedor cahido, carrega o chapéo para a testa e vae para um canto amaldiçoar a casa de Saboia!

Mas que vos fez a casa de Sabóia? Viveis vós em Florença? Viveis vós em

Madrid? Sois vós o povo metralhado na galeria do café de Nápoles? Sois vós o infeliz escritor Roque Barcia preso nas enxovias de Madrid? Sois vós, ó habitantes da Rua dos

Fanqueiros, N. S. P. o Papa Pio IX?

Que possuís vós, na vossa bela cidade de Lisboa, da casa de Sabóia?

Uma senhora.

Uma única senhora! e confessai que, conhecendo da casa de Sabóia só uma senhora — a única acusação que podeis fazer à casa de Sabóia, é qu e ela se veste sem distinção ou se penteia sem gosto! Ora vós, bárbaros, podeis, revolvendo a história, acusar a casa de Sabóia de avara, de ingrata, de invejosa, de sanguinária, de mercenária

— mas certamente não podeis deixar de dizer que a parte da casa de Sabóia que possuís, e vedes de perto, tem uma soberba elegância, um dandismo impecável, e guia melhor os seus póneis que a mitológica Diana!

A casa de Sabóia entre nós é uma questão de toilette e de graça feminina: e melhores toilettes e mais distinta graça — sabei-o, ó bárbaros, não o encontrais na casa de Hohenzollern, onde as mulheres são pesadas e burguesas; na casa de Habsburgo, onde as mulheres ostentam uma majestade de teatro já desusada e caturra; na casa de

Borbom, onde as mulheres parecem intrigantes viragos; e na casa do Hanôver, onde as mulheres têm a frieza da alma e rosto que se sente nas libras! Orgulhai-vos,

Portugueses! Nunca tivestes no trono coisa assim! Conheceis a história? Cuidais por acaso que D. Mafalda, esposa do tão célebre Afonso Henriques, se oferecia ao seu povo incipiente em toilettes mais distintas? Pensais que D. Urraca, consorte do interessante

Afonso II o Gordo, expunha à aragem do Tejo coiffures de um vaporoso tão gentil?

Estais porventura na ideia que D. Mécia Lopes, digníssima metade de Sancho II o

Capelo, se movia com tão airosa debilidade?

Bárbaros! Vós não imaginais que feias rainhas se agrupam no fundo da vossa história! Só os heróicos feitos dos maridos conseguem fazer esquecer os horríveis narizes das esposas. Indagai nas crónicas! E considerai que os valentes que venceram em Silves, no Salado e em Ourique, ao voltarem com as suas armaduras amolgadas dos recontros maravilhosos, só tinham para os acolher e encantar os chatos seios das des-dentadas

Urracas, ou as cuias odiosas das obesas Mécias Lopes!

Ingratos! Ingratos! Vós não merecíeis uma senhora da casa de Sabóia, não — merecíeis uma fêmea da casa de Tuen-Fuem, tirano da Patagónia — nua, disforme, e preta!

É curioso! Que tendes vós, ó patriotas, com a casa de Sabóia? Desde que possuímos entre nós uma pessoa da casa de Sabóia, todo o partido despeitado, todo o ministro demitido, todo o regedor caído, carrega o chapéu para a testa e vai para um canto amaldiçoar a casa de Sabóia!