II


Em 1825 chegaram á esta capital.

Coincidio a sua chegada com a secca terrivel que nesse anno assolou a Provincia, e com os summarissimos julgamentos dos cabeças da revolução do Equador pela Commissão Militar.

Em quanto a natureza em braza fazia dizimar a população com o supplicio cruel da fome, o cadafalso levantado na praça publica fazia rolar inanimes as cabeças dos patriotas cearenses.[1]

Imagine-se a impressão desanimadora que não deveriam causar tão horrorosos espectaculos á mente afflicta d’aquelle que ainda sentia-se roçar pelas lugubres paredes do carcere!

Parece que Céos e terra davam-se as mãos, em um cortejo de desusadas torturas, como que para, por toda parte, atormental-o e perseguil-o.

Era o contrario. E’ que o homem só encherga da natureza a superficie.

Outro ter-se-ia amofinado logo, teria fugido talvez de um paiz só plantado de syrtes e espinhos; seo animo varonil, porem, avigorou-se ainda mais com essas scenas extraordinarias de pranto.

São assim as almas de eleição: da propria desgraça sabem crêar elementos de vida! Os mesmos revezes são-lhes de degráos para a gloria, que nunca teriam conquistado si houvessem envelhecido no obscuro repouso de longa prosperidade.

Os horrores inauditos da miseria foram-lhe de nova e proficua escola de caridade, sublime e universal virtude de que foi sempre fervoroso apostolo; o sangue das victimas a jorrar quente do patibulo feroz crêou-lhe invencivel repugnancia ao algoz, e foi-lhe de proveitosa lição de experiencia para, em toda sua vida, não comprometter a ninguem em emprezas temerarias.


  1. A execução teve logar, em Abril e Maio de 1825, no Campo da Polvora, hoje Passeio Publico, nos seguintes patriotas: Padre Gonçalo Ignacio de Loyola Albuquerque Mororó, Coronel João de Andrade Pessôa Anta, Francisco Miguel Pereira Ibiapina, major Luiz Ignacio de Azevedo, vulgo Bolão, e Feliciano José da Silva Carapinima