Neste tempo estando el-rey em Lixboa lhe tomaram os franceses hũa caravela da Mina com muyto ouro tendo paz com França. Tanto que o soube teve sobre ysso conselho com os principaes que na corte estavam. E todos lhe aconselharam que mandasse sobre ysso hũa pessoa a el-rey de França; e elle disse: “A mi me parece o contrairo do que parece a todos vós outros porque nam quero que a pessoa que laa mandar possa ser mal ouvida ou trazida em dilações do que mais me pesaria que da perda do ouro”, e levantou-se do conselho sem dizer o que queria fazer. Acertou-se estarem em Lixboa dez naos de França grandes e de boas mercadorias; mandou-as tomar loguo todas e recolher com muyto recado as mercadorias n' alfandega e tirar-lhe as vergas e governalhos e meter nelas homens que as guardassem e lançar os franceses fora dellas. E mandou logo a grande pressa con grandes provisões e poderes a Setuvell e ao reyno do Algarve Vasco da Gama fidalguo de sua casa, que depois foy conde da Vidigueira e almirante das Indias, homem de que elle confiava e servia em armadas e cousas do mar a fazer outro tanto a todas as que laa estivessem o que fez com muyta brevidade. E asi mandou outro tanto aa çidade do Porto e a Aveyro. E os donos todos delas se forão a el-rey de França cramar e pedir que lhes fizesse tornar o seu. E el-rey de França pôs loguo tal deligencia e mandou fazer tanto nisso que ouve tudo à mão e mandou a el-rey sua caravella com todo seu ouro, e o das partes sem falecer hũa dobra. E assi o ouve sem nisso falar mandando-lhe ainda el-rey de França dar desculpas; e aos donos das naos mandou logo entregar tudo da maneira que lhe fora tomado sem falecer cousa algũa.