Sinhá da casa,
Venha ver seu pobre;
Nem por vir pedir
Deixo de ser nobre.
"Não pode ser nobre
Quem vem cá pedir;
Não há que lhe dar,
Já pode seguir.
—Não useis comigo
Tanta ingratidão,
Deste pobre cego
Tende compaixão.
"Eu não sou dona,
Nem governo nada,
A dona da casa
Ainda está deitada.
—Se está deitada
Ide-a chamar;
Que o pobre do cego
Lhe quer falar.
"Acordai, senhora,
Do doce dormir;
Vinde ver o cego
Cantar e pedir.
—"Si ele canta e pede
Dai-lhe pão e vinho,
Para o pobre cego
Seguir seu caminho
Larga, Aninha, a roca
E também o linho:
Vai ensinar o cego
Seguir seu caminho.
"Aqui fica a roca,
Acabou o linho;
Marchai adiante, cego,
Lá vai o caminho.
—Anda, anda, Aninha,
Mais um bocadinho;
Sou curto da vista,
Não enxergo o caminho.
"De conde e fidalgo
Me vi pretendida,
Hoje de um cego
Me vejo rendida.
—Cala-te, condessa,
Prenda tão querida,
Eu sou este conde
Que te pretendia.
"Cala-te, conde,
Não digas mais nada;
Só quero saiamos
Daqui desta estrada.
Infinitas graças
Vos dou, meu senhor,
Já ter vencido
Um cruel amor.