Sai hoje pela primeira vez.
A noticia de minha enfermidade divulgou-se de um modo espantoso. Quando passava, apontavam-me de longe. Murmuravam meu nome. Paravam para olhar-me. Admiravam-se talvez de ver-me ainda feições humanas.
Realmente um lázaro não é mais um homem. Foi concebido pela mulher, mas a praga o abortou. No terror que infunde é fera; no asco que excita e verme.
Oh! não... Há um fio que ainda me prende a humanidade. É a compaixão brutal e escarninha do mundo. Mata-se a fera; esmaga-se o verme. Mas não me tiram a mim esse tênue sopro que anima um resquício de vida.
Seria um assassinato! Seria um crime! E há nada mais infame do que um crime inútil?...
Quando me lembro que tantos homens gastam sua existência numa luta incessante para haver uma sombra, que chamam fama, rio-me deles e de mim.
Os feitos do guerreiro, os livros do sábio, serviços á república, e linhagens de fidalgos, andam ignorados ou esquecidos pela turba, vária nas suas paixões. Ninguém sabe, ninguém lembra por que aquela cabeça encaneceu, por que aquela face rugou.
E eu tenho, sem buscar, o que tanto eles buscam sem achar! Toda a cidade repete meu nome. Que importa que esse nome seja o de lázaro? Toda a gente me conhece. Que importa que me evite?
Viver na voz dos povos, não é isso que tantos ambicionam?...