O Rosas balouçava-se em uma grande cadeira austríaca no seu terraço do Flamengo, ouvindo Luciano ler a última carta de Ernestina e uma de Sara dirigida à mãe. Acabada a leitura, o Rosas deitou ao ar o fumo azul do seu havana e o amigo perguntou-lhe:

- E então?!

- É o que eu dizia: você tem de casar com ela!

- É boa! Se a gente tivesse de casar com todas as mulheres a quem faz a corte!...

- Mas você foi mais longe do que isso!

- Aqueles olhos põem-me tonto! A verdade é esta: eu amo Ernestina, mas não quero casar com ela...-

- Por quê?!

- Não sei! Aquela filha... o gênio dela mesmo, incomoda-me, irrita-me! Você não vê esta carta? Manda a filha para Friburgo e é exatamente agora que me pede para não ir vê-la!

- Muito bem. Isso compreende-se... é uma mulher honesta... você, que diabo! É um homem perigoso! Mas, deixe-se de histórias! Peça a viúva e case-se. É mulher garantida, vê-se por essas cartas. Afinal, você gosta dela... lá por embirrar com a filha não é razão! O caso é outro. Você é um galanteador e julga que as mulheres nasceram só para joguetes do seu capricho...

- Bonito! Ponha-se agora com frases...

- Ora! quantos amores já lhe conheci! Mas o tempo passa. Vá-se ver ao espelho! Tem já muitos cabelos brancos e olhe que por ter vindo de Paris não pense que não haja por aí outros mais chics...

Luciano relia a carta de Sara.

- A pequena não escreve mal...

- É muito expansiva!

- Você não compreende? A mãe quer catequizar-me com as cartas da filha.

E guardando os papéis no bolso:

- Bem! Ela talvez deseje que eu lhe desobedeça.

- É até provável que conte com isso...

- Acha?

- Ora! com certeza.

- Pois não vou; há de chamar-me primeiro; se quiser. Hoje vou passar a tarde com...

- Clara Silvestre?

- Não! com o Henrique Bastos... ele convidou-me para um passeio a S. Paulo, vou-lhe dizer que aceito.

- Faz bem.

Entretanto, Ernestina sentia-se febril, quase doente de ansiedade, esperando o momento em que Luciano fosse pedir oficialmente a sua mão. Ele escrevia-lhe de S. Paulo, mas as cartas iam rareando e as saudades crescendo. Ernestina foi duas vezes a Friburgo; afogava a filha em beijos e abraços e voltava com uma enorme lista de encomenda que acrescentava sempre com mais tetéias e gulodices. Todavia, sentia nessa dura experiência ser impossível viver longe da sua querida Sara, e teimava em prolongar a separação, pagando com lágrimas de saudade esse sacrifício.

Três meses depois da ausência, Luciano voltou a casa de Ernestina; encontrou-a em doce palestra com D. Candinha Nunes. Sara voltaria no dia seguinte. Ernestina estava radiante. Ele achou-a pálida, transparecia nela o cansaço da tristeza e da solidão, embora a alegria do momento a sacudisse nervosamente.

Passaram a tarde no jardim; à noite entraram para a sala, mobiliada de novo, e entretiveram-se vendo os arranjos e modificações feitos em tudo pela viúva para surpreender Sara.

D. Candinha exclamava:

- Qual! Não há amor como o de mãe! Vejam como Ernestina pensa na filha!

Luciano abanava afirmativamente a cabeça, vendo Ernestina embaraçada, tateando as coisas,

Às dez horas, como o Nunes não aparecesse, D. Candinha disse:

- Ora, o senhor meu marido esqueceu-se de mim! Seu Luciano, acompanha-me à cidade?

- Até a sua casa, minha senhora. Despediram-se; e Ernestina, retendo a mão de Luciano, disse:

- Ela chega amanhã!... Vem vê-la?

- Certamente...

Não puderam dizer mais nada, D. Candinha, murmurava já fora:

- Que noite linda!