LXXI. PARA O SUL...

Na hora combinada, partiram.

Os dois meninos admiraram muito a magnífica estação central da Companhia Inglesa, no bairro da Luz, onde tomaram o trem que os levaria a Santos.

— É a mais bela estação de caminho de ferro que há no Brasil — observou Rogério. — E esta estrada é importantíssima: vai de Santos até Jundiaí, e ali entronca-se com a Companhia Paulista.

Pôs-se o trem em movimento. Logo ao sair da cidade, notou Alfredo um palácio monumental sobre uma pequena colina que se erguia no vasto campo. Antes que o menino houvesse perguntado qualquer cousa, acudiu Rogério:

— Aquele é o monumento de Ipiranga. À margem do regato que passa por ali, e tem esse nome — Ipiranga — descansava o príncipe D. Pedro, que de São Paulo voltava para o Rio, quando deu o grito de “Independência ou Morte”! viram no Rio de Janeiro, no Largo do Rocio, a estátua de D. Pedro I?... Pois essa estátua representa o príncipe no momento em que parte para o Rio, e lança o grito histórico...

Já o trem conseguira vencer a distância entre São Paulo e a serra do Cubatão, muralha grandiosa que se ergue em face do oceano.

O comboio penetrava pelas gargantas da serra e começava a descer entre os barrancos e sobre as pontes e viadutos, que dominavam e transpõem abismos horrendo, cujo fundo não se vê. A descida é íngreme, e a todo o momento parece que o trem vai despenhar-se por aqueles penhascos... Alfredo tremia de pavor, e Carlos admirava os homens que conseguiram fazer aquela obra portentosa.

Mas o companheiro Rogério não os deixava ficar muito tempo nessa muda admiração:

— Vejam! Vejam isto aqui! — e, com a mão estirada, mostrava-lhes por uma abertura da montanha, em face do mar, a cidade de Santos, numa paisagem única. Era lá fora o oceano, a entrada do porto, o porto, uma larga enseada com os navios e vapores, e a casaria à margem do rio para onde confluíam outros rios e regatos... Antes, porém, que eles pudessem apanhar todos esses detalhes do esplêndido panorama, já o trem dera meia volta, e tudo desaparecera...

Embrenhou-se o trem na serra, e viram-se novas escarpas cobertas de pujante vegetação. Enfim, terminada a descida, passada a estação do Cubatão, na raiz da serra, foi vencida a várzea; quase às onze horas da manhã, chegavam os viajantes a Santos. Entre os paquetes, no cais, estava o Santos, que devia transportar Carlos e Alfredo ao Rio Grande.

Almoçaram, e acompanharam Rogério, que tratava dos negócios da sua casa comercial. Atravessaram várias ruas centrais, muito animadas, cheias de faina dos negociantes, comissários e corretores.

— Daqui, de Santos, — dizia-lhes Rogério — sai todo o café de São Paulo, e grande parte do de Minas. Santos, depois do Rio de Janeiro, é o primeiro porto marítimo do Brasil. É um empório comercial de extraordinário movimento. E sabem? Aqui nasceu o famoso padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão, inventor do aerostato...

Quando se dirigiram para o paquete, admiraram o imenso cais, as docas em que atracavam e desatracavam navios. Enfileiravam-se armazéns da alfândega e de depósitos. Montes de sacas de café enchiam os armazéns, empilhavam-se ao longo do cais, atulhavam os carroções em filas que interrompiam o trânsito.

O paquete afastou-se lentamente do cais, e ganhou o mar...