Contos Tradicionaes do Povo Portuguez/A sepultura dos dois irmãos


242. A SEPULTURA DOS DOIS IRMÃOS
EM CINTRA

Dois irmãos traziam amores com uma donzella que por aquelles sitios habitava, ignorando ambos os amores um do outro. Acontecendo por uma triste fatalidade encontrarem-se os dois irmãos em uma noite tenebrosa, debaixo do balcão do objecto que tão enfeitiçados os trazia, um d’elles persuadido que o outro lhe disputava os favores da sua dama, corre cego e inconsiderado sobre elle e o estende morto a seus pés, victima de um frenetico ciume. Porém qual a sua desesperação quando pela voz moribunda d’aquelle que julgava seu rival, reconhece ter sido o assassino de seu proprio irmão, que muito amava e que lhe expira nos braços! Cheio de desespera­ção volta contra o peito o ferro fratricida, e cae morto sobre o cadaver ensanguentado do irmão, preferindo uma morte prompta a uma vida inconsolavel cheia de remorsos.

(Cintra Pittoresca, p. 114.)



245. — Esta lenda tambem existe em Verona, contando-se a situação como passada entre Bartolomeo Scaligero e seu irmão, que se assassinaram em uma entrevista amorosa. (Philaréte Chasles, Etudes sur Shakespeare, p. 159.) Diz o Abbade Castro: «Muitas tradições vogam ácerca d'esta campa, que nós temos por falsas ou viciadas… referindo uns que é a sepultura dos dois irmãos, outros diversas lendas que mais se assemelham a contos de fadas ou de velhas com que embalam as crianças, do que realidades, que tenham por base algum solido fundamento.» (Panorama, t. I, da 2.ª serie, p. 359.)