Correspondência ativa de Euclides da Cunha em 1900

S. José do Rio Pardo, 15 de maio de 1900 editar

Pethion de Villar

O portador desta não é um amigo apenas ― é um advogado. E não vai somente encarregado de abraçar por mim, obscuro rabiscador do Sul, ao grande poeta do Norte ― leva também a delicada incumbência de atenuar condenável incorreção apresentando-te valiosas razões justificativas de um silêncio que sou o primeiro a lamentar.

Entre outras coisas dir-te-á que levo a mais inútil das vidas em perene conflito com a minha engenharia obscura cujas exigências me afastam de outras ocupações mais atraentes às quais somente dedico um ou ou quarto de hora de folga nos meus dias fatigantes de operário.

Por isto o meu livro sobre a interessantíssima luta nos sertões da tua terra ainda não apareceu. Está, porém, agora ― finalmente, pronto e ainda que seja o primeiro a considerá-lo lardeado de defeitos sérios entre os quais avulta certa falta de unidade oriunda das condições em que foi escrito ― tem, preponderante, uma qualidade que o nobilita: a sinceridade com que foi traçado.

Será seu único valor.

Por isto, talvez não faça jus à consagração de uma versão para o francês a que espontânea e cavalheirescamente te propuseste quando aí estive. Transplantado à mais vibrátil das línguas, por um parisiense dos trópicos, temo que o meu estilo, algo bárbaro, não se afeiçoe a tão delicado relevo.

Em todo o caso não me deslembrei do honroso oferecimento e caso desejares enviarei um excerto qualquer como prova indispensável.

E adeus.

O meu digno amigo dr. José Leite substituir-me-á com vantagem dando outras notícias. Pedindo que me recomendes a toda a Exma. família sou cordialmente

Euclides da Cunha