Ecos da minh'alma/Ao Snr. Augusto Frederico Colin


O tôsco producto de mente acanhada
Quizeste 'n um canto sublime exaltar;
Ao som desacorde de lyra tão rude
Harmonico accento quizeste chamar.

Teu genio inspirado, que ao céu se remonta,
Que, estrella formosa, no espaço já brilha,
Benevolo honrando das musas a filha
Lhe anima o talento, que apenas desponta.

Um hymno lhe déste de tanta poesia,
Que o Vate d'Ignez, si ao mundo tornasse,
Ouvindo-te as notas tão meigas, tão dòces,
Talvez qu'esse hymno mimoso invejasse.





Teus louvores agradeço ;
          Mas conheço
Que os não posso merecer;
Minha musa tão mesquinha,
          —Coitadinha!—
Apenas sabe gemer.

Mas inda que gema afflicta,
          Não imita
Da rôla o terno queixume,
Quando lhe roubam do ninho
          O filhinho,
Que 'n elle abrigava inplume.

Não tem do cysne a voz pura,
          Na tristura
Do derradeiro cantar;

Modulando, ao som das aguas,
          Suas maguas,
Antes d'a vida findar.

A voz da misera louca
          É tão rouca,
Que agradar não póde a alguem;
Só tu d'ella dó tiveste,
          E lhe déste
Canto que afinal-a vem.

Minha pobre, inculta musa,
          De confusa,
Nem te sabe responder;
Teus louvores agradece;
          Mas conhece
Que os não póde merecer.




Si eu tivera um ingenho inspirado,
Um ingenho que ao teu igualasse ;
Si uma lyra eu tivera divina,
Que tão bem, como tu, dedilhasse ;

Oh! da patria o amor, que admiras,
Qual o sinto no meu coração,
'Nessa lyra cantar altaneira
Fôra o meu mais honroso brazão.

Sim; que a terra, que adóro extremosa,
A nenhuma minh'alma compara;
E a ventura de amal-a, de vel-a,
Pelo throno melhor não trocára.

De — su'alma no livro — o poeta,[1]
Retratando da patria a lindeza,
Diz — ciumes soffrer, si imagina
Outra terra, que a vença em belleza.

Eu, porem, que na minha contemplo
Primavera perenne a sorrir,
Não concebo que possa no mundo
Um paiz tão formoso existir.

Quando vejo esta terra, que eu amo,
Por estranha nação ultrajada;

Quando, ingratos, alguns de seus filhos
Não se importam de vel-a abysmada;

De profunda tristeza opprimida,
Chóro o mal do meu bello paiz,
E só vivo ditosa e me alegro,
Quando altivo ergue a fronte feliz.

Patria! Patria gentil, feiticeira!
Terra santa, d'est'alma querida!
Quanto não estimara ser homem
Para inteira te dar minha vida!




Linda terra do meu berço,
Quanto me viras folgar,
Si a trôco de minha vida
Te fizesse prosperar!

Embora invejoso estranho
Te attribua imperfeições;
Amára, quando os tivesses,
Esses teus mesmos senões;

Mas não os tens, patria amada;
És formosa sem senão;
Tu, das nações do Universo,
Es a mais bella nação.

Bem como a lua ás estrellas
Em fulgores ultrapassa,
Assim tu, paiz querido,
Aos outros vences na graça!

Linda terra do meu berço,
Quanto me viras folgar,
Si a trôco de minha vida
Te fizesse prosperar!

Mas não posso defender-te
Contra bellicos furores;
Só tenho, p'ra dar-te, um peito,
Que por ti morre de amores;

Um peito, que ardente e louco,
Sabe por ti palpitar;
Que exulta com teus triumphos,
Que chóra com teu penar.

Tu és a copia formosa
Do paraizo de Adão;
Tu, das nações do Universo,
És a mais bella nação.




A ti, Vate, que prézas meus versos,
Eu na lyra tentára cantar,
Si essa lyra divina tivera,
Que tu sabes tão bem dedilhar.

Mas, qu'importa que louve teu genio
'N estes cantos tão rusticos meus,
Si os humildes insectos da terra
Tambem erguem louvores a Deus?

Eu, Poéta, aprecio, e admiro
De teu genio o superno condão;
Pasmo, ao ver amplo vôo eleval-o
A ethérea, immortal região!

Tua lyra, por Deus afinada,
Como harpa de Archanjos resôa,

Si amarguras entôa da vida,
Si de amor as delicias entôa.

Um caminho juncado de rosas,
O Senhor ordenou-te seguir;
Para ti, com justiça, prepara
Escolhido, brilhante porvir.

Oh! prosegue na senda de gloria
Que te abrio o Supremo Juiz!
Não recues, si houver nella espinhos;
Os espinhos serão teu matiz!

4 de Maio de 1851.

  1. O Sr. João de Aboim.