LVII
Canto de Outono
Vamos, prestes, entrar na frígida estação;
Adeus, fulgente luz dos dias estivaes!
Ouço descarregar, com notas sepulcraes,
A lenha destinada ao lume do fogão.
Torna a invadir meu ser todo o inverno: terror,
Odio, raiva, paixão, constante mal-estar;
E, como o rubro sol na fornalha polar,
Transforma-se meu peito em brasa sem calor.
Escuto, horrorizado, as madeiras caíndo;
Um cadafalso a erguer não produz som mais triste.
Como torre ou castelo, a alma não resiste
Aos botes que o ariete, audaz, vae despedindo.
Embalado p’lo som monótono, parece
Que pregam um caixão, á pressa, aqui ao lado...
O Estio vae morrer... O Outono está chegado!
O misterioso som lembra piedosa prece.
Eu amo a verde luz do teu profundo olhar,
Mas não ha nada já que minh’alma comova;
Bem mais que teu amor e tua alegre alcova
Vale hoje para mim o sol beijando o mar.
Mas não deixes de amar-me, ó alma boa e pia!
Serve de mãe ao triste, á ingrata creatura;
Amante ou minha irman, sê a efêmera doçura
D’um glorioso outono ou de um sol na agonia.
Tenho a cova a esperar l... será curta a missão.
Oh! deixa em teu regaço a fronte repousar,
E, chorando o estio ardente, saborear
A amarelida luz d’este fim de estação!