Meu Captiveiro entre os Selvagens do Brasil (2ª edição)/Capítulo 53

CAPITULO LIII
De como em Dieṕpe fui ter á casa do
armador do Bel´Eté

De Dieppe havia partido o Bel´Eté, de que era agente Karvatuvare, o interprete que aconselhara aos selvagens a que me comessem.

A esse mesmo navio pertencia o bote que não quiz receber-me quando escapei dos selvagens. A elle ainda o capitão que dera a devorar aos cannibaes um portuguez colhido num barco apresado.

O Bel´Eté não tinha regressado ainda, apezar de que, pelos calculos do capitão do Vattaville, devia ter entrado em Dieppe tres mezes antes de nós.

As mulheres e amigos da tripulação do Bel´Eté vieram procurar-me para pedir noticias.

— Sei lá delles! respondi. E' gente má e pouco me imoprta aonde estejam.

Depois contei o que pasara. Disse que um dos de bordo, estando em terra e vendo-me em mãos dos selvagens, aconselhara-os a que me comessem, facto que só Deus havia impedido. Disse que outros, indo de bote até á taba onde eu vivia prisioneiro, recusaram-se a receber-me quando fugi aos indios a nado e alcancei a embarcação. Contei tambem do portuguez que tinham dado a devorar aos cannibaes.

Não obstante, estava ali a dar noticias delles!

Hão de chegar quando for possivel, mas eu prophetizava que Deus não deixaria impune o crime praticado contra mim.

Depois contei-lhes como tudo havia corrido bem, o bom vento e a fartura de peixe, para aquelles que me acudiram e me resgataram aos selvagens.

Os ouvintes mergulharam-se em tristeza e indagaram se eu os suppunha ainda vivos.

Para os não desesperar disse que era possivel tal coisa, apesar de todos os indicios em contrario. Em seguida despedi-me, dizendo-lhes que se acaso esses maus reapparecessem, que fossem informados da minha estada alli e de como me havia Deus ajudado.

De Dieppe parti para Londres, onde fiquei uns dias; depois fui a Seeland, e finalmente a Antdorff. E assim ajudou-me Deus todo poderoso a alcançar novamente minha patria.

Louvado seja elle eternamente. Amem.

Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.


Caso seja uma obra publicada pela primeira vez entre 1929 e 1977 certamente não estará em domínio público nos Estados Unidos da América.