Quadros da vida.
TARDE linda, hontem. Conversava-mos á janella, eu e o Quim, sobre a acção ideologica de Ruy neste paiz e sobre a ascensão ininterrupta da grande figura nacional.
— Sobe sempre..
— Já aquelle desce, desce sempre, disse Quim.
Referia-se ao Pedro Inchado, mendigo habitual da nossa rua. Lá vinha elle, todo farrapos, immundo. Ha mendigos decentes, que guardam a compostura da miseria. Este, perdeu tudo e é no moral tão roto como no physico. Sem camisa — um trapo de paletó sobre o couro gafeirento; sem ceroulas — vêem-se-lhe pedaços de perna pelos buracos da calça immunda. Passou por nós e apanhou varias pontas de cigarro.
— Desce sempre. Ha mezes pilhei-o a apanhar um cigarro, mas olhava para os lados antes, a ver se era observado. Perdeu já este ultimo pudor...

Esta obra entrou em domínio público pela lei 9610 de 1998, Título III, Art. 41.

