O Sr. Osório Duque Estrada é professor, jornalista, poeta, conteur e, de vez em quando, crítico de arte. Há tempos, em campanha de eleição acadêmica, foi o nome do Sr. Osório Duque Estrada muito falado. Alto, louro, forte, no auge das ambições, o Sr. Osório escreve-me uma carta rápida e cortante.
Antes, porém, quando o mesmo escritor disputava uma cadeira na Academia, mandaram-me graciosamente esta nota para um dicionário, que não pretendo fazer:
"Osório Duque Estrada, nascido em Vassouras, Estado do Rio (1870), bacharel em letras pelo ex-colégio Pedro II; foi secretário de legação e encarregado de negócios no Paraguai (1891 a 1892); foi inspetor geral do ensino no Estado do Rio, por concurso, tendo também exercido ali os cargos de membro do Conselho Superior da Instrução e de lente de Francês do Ginásio Fluminense.
É atualmente lente de História Geral e do Brasil do Ginásio Nacional.
Tem publicado: Alvéolos (poesias) 1886, Zaida (poemeto) 1894, O Fonógrafo indiscreto (comédia), A aristocracia do espírito, Cartas do Paraguai, A questão do divórcio, Gramática portuguesa, Questões de português, Flora de maio (poesias) 1902.
Colaborou em alguns jornais de S. Paulo, em quase todos os desta cidade, e foi fundador e redator-chefe do Eco de Cataguases (Minas).
É ainda autor de três revistas de ano, duas das quais já foram representadas, tendo concluído ultimamente três libretos de óperas, sendo um escrito em francês e outro em italiano."
Tão preciosa nota não podia deixar de ser publicada.
Eis a carta:
"Meu caro. — Aí vai em quatro palavras o que entendi responder ao questionário que me dirigiste.
Quatro palavras apenas, para não me comprometer muito: é a melhor maneira de responder às enquêtes literárias, principalmente quando se tem sobre os ombros a responsabilidade de uma candidatura à Academia de Letras.
Aí tens, com alguma cautela, cinco respostas que pouco adiantarão à tua curiosidade:
1ª. As três maiores fontes de poesia, segundo Hugo: a Bíblia, Homero e Shakespeare; entre os modernos: Goethe e Hugo, na poesia; Flaubert e Zola, os Goncourt e Eça de Queirós, no romance.
2ª. A Flora de Maio; desta as poesias Dolor Supremus e Em Passeio, além do Livro de Isa. Em prosa: O Paraguai e a Questão do Divórcio.
3ª. Sim, atravessamos um período estacionário. Os representantes das diversas escolas são ainda os mesmos de 20 anos atrás, mas emudeceram quase por completo.
4ª. Não me parece; a inspiração literária, para consumo de todo o Brasil, continua a ser importada de França, e chega muito deteriorada pelos imitadores sem talento, principalmente de Verlaine.
5ª. Atualmente é um péssimo fator. Dominou-o o espírito prático da época; o jornalista está quase substituído pelo repórter; as redações, de focos intelectuais, converteram-se em casas de negócio; as colunas da imprensa estão quase trancadas às produções intelectuais; os talentos reais, que ainda colaboram nela, já refletem o espírito prático dessas empresas mercantis: a crônica política, o comentário sobre os assuntos da vida burguesa e conservadora, a chalaça pérfida, o verso mordaz e a invectiva sórdida ou desabalada substituíram a obra forte da intelectualidade.
Ninguém produz, porque já não há quem leia. O futuro se me afigura ainda pior: a desorganização e a imoralidade no ensino vão preparando novas e mais temerosas ousadias do bacharelismo analfabeto.
Atravessamos uma época de crise intelectual bastante aguda. Um fator político a justifica, pela asserção de Guyau: la démocratie tue l'art. É lógico e irrecusável. Nesse particular, a República foi uma calamidade para o Brasil.