Os manifestos de agosto contêm a doutrina do rompimento entre Portugal e Brasil: formam a exposição da cisão constitucional que acabou com o Reino Unido fundado e legitimado por Dom João VI. Um foi o ato nacional, o outro o ato internacional da abertura das hostilidades, coincidindo aliás com atos positivos de guerra. Existia mesmo, desde algum tempo, entre as duas seções da monarquia um estado que se não poderia chamar de paz e a independência não foi afinal mais do que a exteriorização dessa situação qualificada nos últimos tempos por medidas contrárias, respectivamente tomadas pelos dois governos irmãos.
Portugal continuava a afetar sempre que manejava a férula: ao decreto de convocação da Constituinte Brasileira respondeu com o decreto de 24 de setembro - cronologicamente já posterior ao grito do Ipiranga - declarando nulos quaisquer atos legislativos emanados da regência do Rio de Janeiro; mandando verificar a responsabilidade dos secretários desse governo "de fato e não de direito", que tivessem referendado tais atos; considerando traidores os comandantes de terra e mar e criminosas quaisquer outras autoridades que obedecessem ao sobredito governo a partir da publicação do presente decreto, salvo em casos de coação pela força; dando por finda a delegação do poder executivo confiado ao príncipe real e por nomeada uma regência nos termos da constituição [1], e ordenando ao ex-regente o embarcar para Portugal no prazo de um mês contado desde esta intimação, sob pena de perda dos seus direitos de sucessão à Coroa.
Pelo teor do decreto das Cortes a permanência de Dom Pedro no Rio de Janeiro tornara-se, não só desnecessária como "indecorosa à sua alta hierarquia", e convindo ao futuro da nação que aquele que teria de vir a ser seu soberano fizesse sua educação política constitucional, mandavam-no os representantes do povo viajar incógnito pelos países onde o sistema deixara de ser absoluto, acompanhado por pessoas esclarecidas, virtuosas e fiéis aos novos princípios.
Quase dois meses antes a regência brasileira, que já era uma regência nacional, adotara porém uma resolução com relação a Portugal que virtualmente encerrava uma declaração de guerra e que constituía a resposta adequada à proibição do despacho de armamento do estrangeiro para os portos do Brasil, sob pena para os contraventores do confisco da carga e do navio. Alguns tinham então considerado semelhante proibição como uma medida bélica [2] e ela importava pelo menos no reconhecimento de uma condição de rebelião no reino americano e portanto na admissão do estado de sítio pela limitação posta à liberdade comercial.
A medida brasileira era contudo mais drástica ainda: nem é de resto tão fora do comum que as hostilidades ocorram praticamente antes de teoricamente estabelecidas. No decreto de 1.º de agosto, pelo qual mandava o príncipe regente reputar inimigas todas e quaisquer tropas portuguesas que fossem mandadas ao Brasil, sob não importa que pretexto, sem seu prévio consentimento, bem como as guarnições e tripulações dos navios que as transportassem, Dom Pedro declarava com um tanto de exagero que fora confirmado "por unânime consentimento e espontaneidade dos povos do Brasil na dignidade e poder de regente deste vasto Império que el-rei meu augusto pai me havia outorgado, dignidade de que as Cortes de Lisboa, sem serem ouvidos todos os deputados do Brasil, ousaram despojar-me, como é notório".
O decreto invocava ainda os encargos que lhe cabiam como defensor perpétuo daquela "máxima parte da Monarquia portuguesa" que nele se confiara; a política das Cortes, de recolonização pela força armada, apesar do Brasil já haver "proclamado sua independência política" e convocado uma Assembléia Constituinte Legislativa a requerimento de todas as câmaras municipais, quando o Congresso de Portugal fora na sua origem somente "um ato de clubes ocultos e facciosos; o fato de Dom João VI estar prisioneiro, sem dispor daquela liberdade de ação que é dada ao poder executivo nas monarquias constitucionais, para mandar "rechaçar com as armas na mão por todas as forças militares de 1.ª e 2.ª linha e até pelo povo em massa" qualquer tentativa de desembarque no Brasil, "pondo-se em execução todos os meios possíveis para, se preciso for, se incendiarem os navios e se meterem a pique as lanchas de desembarque".
Se, apesar de toda resistência e mau grado as fortificações mandadas levantar e as munições e petrechos mandados reunir, as tropas de além-mar tomassem pé em algum porto ou parte da costa, cumpria aos habitantes retirarem-se para o centro levando para as matas e montanhas todos os mantimentos e boiadas de que pudessem utilizar-se", enquanto as tropas de terra faziam aos invasores "crua guerra de postos e guerrilhas, evitando combates gerais".
Pela letra do decreto continuavam entretanto "livres as relações comerciais e amigáveis entre ambos os reinos para conservação da união política, que muito desejo manter". Assim dizia o príncipe, mas a contradição era flagrante entre união política e independência política, esta excluindo aquela na forma porque estava sendo posta e estava sendo compreendida. Nem o ajuste das relações mercantis entre as duas seções da Monarquia conseguiu vingar nas Cortes. O trabalho emendado da comissão só foi apresentado a 14 de setembro, subsistindo porém nas suas piores feições, sem curar dos debates travados, o espírito que o animara, exclusivo e interesseiro.
O momento era aliás péssimo para intentar novas discussões a respeito, achando-se pendente a questão máxima da adoção da Constituição pelos representantes americanos. Manuel Zeferino dos Santos voltou contudo à carga, auxiliado por Castro e Silva, do Ceará, e denunciou a proposta ardilosa de Ferreira Borges, especialista na matéria, de manter-se até um estudo mais aprofundado do assunto a tabela extravagante que, no intuito de dar a Portugal o monopólio do tráfico ultramarino, estabelecia, por exemplo, a taxa de um por cento para o algodão transportado em embarcações nacionais e de quinze por cento para o que fosse transportado em vasos estrangeiros. O projeto voltou à comissão para no seu seio se harmonizarem as opiniões, que apareciam fundamente divergentes e eram de fato irreconciliáveis porque não era um simples debate acadêmico que se agitava, sim uma luta de vida e morte que se abrira entre as economias dos dois países. O manifesto de 6 de agosto increpava mesmo as Cortes de terem esbulhado o Banco do Brasil da administração dos contratos que lhe concedera el-rei para amortização da dívida contraída.
Neste ponto as Cortes mereciam antes piedade do que censura, porque se achavam colocadas numa postura difícil, entre a resistência do Brasil, já descambando em rebelião, e a impopularidade em Portugal, ameaçando transformar-se em levantamento.
O manifesto de 1.º de agosto foi redigido por Ledo. Constitui o histórico do divórcio político imanente e encerra a sua justificação. Como mandava dizer Mareschal para Viena [3], esse documento formava o complemento de quanto aparecera desde janeiro e definia finalmente de modo claro e sem reticências a atitude do governo da regência brasileira. A impressão produzida no país pela sua publicação foi grande e o encarregado de negócios da Áustria confessava à sua chancelaria que o público acolhera bem as razões expostas, calando-se a facção portuguesa por perceber que o governo nacional se robustecera com suas francas declarações.
Apenas dois sargentos dos da expedição de Francisco Maximiliano tinham feito representação adversa, dirigida ao príncipe, e sido por isso severamente castigados. Aí se deparava contudo, no entender de Mareschal, um apoio perigoso para a autoridade constituída além-mar e precioso para quem dele se quisesse valer. O espírito dessa gente aliciada ficara sendo o da sua nacionalidade e aqueles sargentos foram os primeiros do pronunciamento gorado que terminou em açoites dos quais fez grande escarcéu a correspondência diplomática de Condy Raguet, o encarregado de negócios dos Estados Unidos [4].
"Brasileiros! está acabando o tempo de enganar os homens" - começa por dizer o manifesto. Por terem pretendido tal coisa, as Cortes de Lisboa forçaram as províncias meridionais do Brasil a repelirem o seu jugo e o Brasil todo se congregou em redor do regente para que este defendesse os seus direitos e mantivesse a sua liberdade e independência. Foi semelhante proceder das Cortes que levou ao exame dos títulos em que se apoiava Portugal para aventar tão desassisadas pretensões, qual a de forçar o Brasil a aceitar um sistema desonroso e aviltador, em desacordo com os próprios princípios sobre que se fundara a revolução de agosto de 1820 e com as bases que representam os direitos inalienáveis dos povos. Os mandatários do povo de Portugal passaram porém a soberanos do soberano de toda a monarquia portuguesa e, intitulando-se pais da pátria, iniciaram uma marcha desorientada e tirânica. "Julguei então indígno de mim - exclamava o príncipe - e do grande rei, de quem sou filho, e delegado, o desprezar os votos de súditos tão fiéis; que sopeando talvez desejos, e propensões republicanas, desprezaram exemplos fascinantes de alguns povos vizinhos, e depositaram em mim todas as suas esperanças, salvando deste modo a realeza neste grande continente americano, e os reconhecidos direitos da augusta Casa de Bragança".
As Cortes não se deram todavia por ensinadas com a lição do Fico, e em vista do seu egoísmo e dos seus tramas, as províncias coligadas do Brasil projetaram, "sem o estrépito das armas, sem as vozearias da anarquia", a instalação de uma Assembléia Constituinte e Legislativa Brasileira. Nem assim cedendo as Cortes aos ditames da razão e da justiça, o príncipe teve de tornar efetivo o seu papel de defensor perpétuo para sobrestar os males da desordem e os furores da democracia explodindo nas suas facções, sob pena de "lacerar-se o Brasil, esta grande peça da benéfica natureza, que faz a inveja, e a admiração das nações do mundo".
O manifesto, no intuito de afastar a responsabilidade do seu augusto signatário na solução que se antevia violenta, passa então a enumerar, "pelo respeito que devemos ao gênero humano", todas as afrontas e iniquidades assacadas pelo Congresso de Lisboa, cujo fito patente aos espíritos desprevenidos era "paralisar a prosperidade do Brasil, consumir toda a sua vitalidade, e reduzi-lo a tal inanição e fraqueza, que tornasse infalível a sua ruína e escravidão".
A lista era longa e está apresentada com habilidade e calor, de maneira a gerar simpatia nos que nela atentassem. Por outro lado o programa da Constituinte nacional chega a ser idílico, tal era o ambiente de sinceridade e de pureza em que se desdobrava. Os direitos brasileiros, "calcados aos pés e desconhecidos a três séculos", tinham afinal recebido ou melhor dito iam receber a sua consagração. Responsável o funcionalismo; dotada de um vôo altaneiro a vontade da nação; eliminados os abusos; espalhada a luz no "caos tenebroso" da administração, da fazenda e da legislação; esclarecida e lisa a justiça; íntegros os magistrados; humanitário o código penal; eqüitativos os impostos; posto às claras o sistema financeiro; elevada a disciplina militar, que não exclui as virtudes cívicas; honradas as profissões liberais e honrado o cultivo das letras e das ciências; apreciada a virtude e reconhecido o mérito; zelada a educação - eis o que o futuro reservava a nação brasileira, em harmonia com o "fluxo da civilização que começa a correr já impetuoso desde os desertos da Califórnia até ao estreito de Magalhães".
À Europa oferecia o Brasil paz e comércio livre, ao mesmo tempo que protestava não se envolver nos negócios particulares do Velho Mundo. "Constituição, e liberdade legal são fontes inesgotáveis de prodígios, e serão a fonte, por onde a bem da velha, e convulsa Europa passará ao nosso continente".
Todo o final é um hino à união e à independência, uma exortação às províncias para formarem "o feixe misterioso, que nenhuma força pode quebrar", um apelo patético para sacrificarem o seu espírito regional, o que depois se chamou bairrismo, ao espírito novo do patriotismo.
O manifesto de 6 de agosto é obra de José Bonifácio e constitui um documento comprobativo do seu espírito americano no conceito de Mareschal, o qual era de resto o primeiro a reconhecer que o sentimento político de uma incipiente solidariedade continental, esse entusiasmo americano porté au plus haut degré, que o ministro de Dom Pedro procurava incutir no ânimo do regente e de que saturava sua linguagem oficial, era ou devia ser inevitável na alma de um príncipe destinado a reinar em terras americanas [5].
Mareschal achava, é claro, preferível que os brasileiros professassem esse embrionário pan-americanismo, que lhe parecia mais geográfico do que proselítico, a que se deixassem arrastar por princípios puramente revolucionários, que tanto importava dizer republicanos. No seu juízo, entretanto, a designação de americano tinha forçosamente de equivaler a democrático. Aliás expurgada a França, como o pensava a Santa Aliança, do espírito revolucionário pela restauração da realeza tradicional, embora adaptada a certas fórmulas constitucionais, e em véspera de ser abafado na Espanha o foco ultra-liberal que ali vingara, a América ficava sendo o continente republicano; mas lá mal podia atingir a ação reacionária, mesmo antes de definida a doutrina de Monroe, o que ocorreria no ano imediato.
O sentimento americano manifestou-se primeiro nas colônias espanholas pela organização dos seus regimes políticos e sistemas de governo imitados dos Estados Unidos. Conservadores em matéria de constituição social, os dirigentes dessas novas nacionalidades, os quais sobretudo entenderam firmar o direito a governá-las que tinham os filhos da América e de que andavam esbulhados pelos filhos da Europa [6], foram radicais em matéria de constituição política.
Outro tanto aconteceu no Brasil, onde veio porém a imperar de preferência a sugestão liberal européia ocidental, a saber, inglesa e francesa, a qual achou meios de acomodar-se, tal qual sucedeu à democracia americana, com a instituição servil que nas colônias espanholas foi inicialmente suprimida, ao mesmo tempo que era proclamada a liberdade para esses países de regerem os seus destinos. Neste ponto se distanciou de modo notável a América Espanhola da Inglesa e da Portuguesa, onde o braço escravo, que era sobretudo africano, se afigurava um instrumento econômico indispensável, a ser perpetuado.
Em ambas estas terras de escravidão - a abolição no Brasil ainda levaria 66 anos para consumar-se - existia apesar disso mais espírito democrático do que na maioria das colônias espanholas, cujo pendor aristocrático se patenteou na oligarquia portenha avassalada pelo caudilhismo gaúcho e que só depois de 1852 tiraria sua desforra, e se evidenciou nas primeiras constituições chilenas em que o Senado Americano se refletiu numa imagem de aumento. Efeito talvez da mestiçagem muito mais abundante, o fato é que aquele espírito igualitário predominou no Brasil mesmo através do Império e que, senhores feudais como eram, pelo poderio que exerciam sobre seus dependentes, os fazendeiros e senhores de engenho nunca deram mostras de querer aproveitar-se da sua posição e riqueza para com elas formarem a base de uma preponderância política a que só aspiravam moderadamente, muito provavelmente porque sentiam pairar sobre eles a majestade da autoridade imperial. Em vez de constituírem uma vasta oligarquia, delegaram desde o começo sua participação na vida pública nos profissionais da administração - bacharéis, juristas, legisladores.
A democracia brasileira foi assim paralelamente política e social, teórica e prática, fundada nos costumes e na onipotência da razão. Foi todavia graças especialmente a José Bonifácio que a feição construtiva primou a negativa por ocasião da emancipação nacional. O representante diplomático dos Estados Unidos no Rio de Janeiro em 1822 tinha de José Bonifácio a impressão de que era um delineador mais do que um executor, de que lhe faltava talvez em maleabilidade de ação o que lhe abundava seguramente em sagacidade de pensar [7]. Era pois um homem nascido para as eminências, capaz de representar um momento histórico, sobretudo associando sua iniciativa intelectual a uma ação vigorosa qual a que lhe prestou o regente. Sua argúcia de estadista, se era o efeito de um predicado pessoal, fora porém aguçada pela sua farta e já longa experiência da vida. A natureza dos seus principais estudos, botânicos e mineralógicos, dera por outro lado uma feição prática ao seu espírito, ao qual não era originariamente estranho um lirismo até ardente e sensual, e o seu liberalismo, tal como se denuncia nos seus planos de utilidade pública, era antes econômico do que político, quer dizer que não sacrificava a realidade à imaginação.
Entretanto parecia a Mareschal que havia no manifesto de 6 de agosto, cuja autoria lhe era conhecida, muita fraseologia ociosa sobre liberdade, soberania do povo, direitos das nacionalidades, tudo aquilo que horripilava a Santa Aliança e os seus agentes, num pavor de que tais fórmulas voltassem à arena da discussão com a sua capacidade incendiária. Monsieur d'Andrada, felizmente, pois que era o pivot do governo, não era um democrata, um liberal na acepção comum e perigosa da palavra: "luta contra a revolução - dele escrevia Mareschal - não sossegando e esclarecendo os espíritos, mas desviando-os, oferecendo-lhes outra meta, mais ao alcance e mais consubstanciada com os seus interesses" [8]. Nesse caso era a independência dentro do círculo monárquico. O diplomata austríaco era de opinião que a independência já existia de fato e de direito, mas considerava um ato político de grande transcendência o dar o governo da regência o impulso quando parecia segui-lo, tomando a dianteira do movimento em vez de ser por este arrastado. Assim o via inspirado e assim o via praticar.
Mareschal censurava apenas no manifesto as referências que Dom Pedro autorizava com sua firma aos atos tirânicos dos seus avoengos e às prodigalidades da corte paterna. É que José Bonifácio não se sabia muito bem conter, nem nos arroubos poéticos, nem nas graçolas das cartas particulares, nem nas apóstrofes dos documentos públicos: era sempre o mesmo homem descrito por Maler como fougneux et très ardent, uma cabeça vulcânica debaixo das cãs, o que segundo o rabugento encarregado de negócios da França dos Bourbons, lhe roubava "a madureza das idéias, o método na concepção dos projetos e o sistema no seu conjunto e aplicação".
O momento histórico era em demasia não só agitado como crítico, tratando-se de uma nacionalidade em formação, para a serena realização de um programa fixo e pautado de planos de governo. Do que se cuidava antes que tudo era de obter a separação com o menor sacrifício possível de vidas e de fazenda. Nesse mês de agosto as hostilidades já se tinham anunciado em terra, na Bahia, mas no mar as duas esquadras não se tinham ainda medido. O comandante brasileiro não recebera ordem para atacar e o português por seu lado evitava ser o primeiro a derramar sangue.
A guerra trazia em si conseqüências de todo gênero. Ela podia facultar ao Príncipe a ditadura que a facção avançada lhe estava de antemão disputando. Pelo contrário do que Mareschal se arreceava era de que as duas constituintes, a portuguesa, e a brasileira, pudessem chegar a um acordo e juntas empreenderem obra política de caráter democrático. É verdade que não existia na América, no mesmo grau que na Europa, um ancien régime a destruir e quando o houvesse, sendo os agentes da demolição os próprios elementos desse regime, não se haviam de destruir eles pessoalmente. Mais natural seria que buscassem harmonizar a ordem de coisas antiga com a moderna. Assim foi que continuaram usos tradicionais, que se prolongaram velhas instituições, que se perpetuou em vários pontos a legislação privada que já desconhecia certas servidões da classe livre na Europa, como as corvées francesas. A Igreja possuía os seus bens de mão morta, mas sabemos que o dízimo, que era o tributo, fora sempre cobrado pelo Estado, pela razão de que o rei como grão-mestre da ordem de Cristo provia as necessidades do culto.
A obra da independência devia consistir em tornar extensivas aos novos países as feições integrais de uma civilização até aí privativa das suas ex-metrópoles, qual era a civilização européia. Nesta veio porém a distinguir o espírito americano, que o meio e as circunstâncias do desenvolvimento local tinham criado e fariam predominante. Em toda a América existe uma espécie de preconceito, de superstição constitucional proveniente das condições da sua organização política, que obedeceu a fórmulas e teorias quando na Europa continuou em muitos casos a ser vazada em moldes consuetudinários.
Isto se explica facilmente porque na América as constituições representavam um protesto, primeiro contra o passado colonial, julgado de opressão e depois contra o sistema europeu, julgado de reação. Do desacordo original, mais tarde degenerado em conflito, entre tais fórmulas legais, representativas da concepção social gerada pela filosofia do século XVIII, e a condição cívica das populações que por elas se tinham de reger, nasceu o estado de constante agitação política da América Espanhola no século XIX. Se outro tanto não aconteceu na América Inglesa e na América Portuguesa, foi porque para a primeira foi transplantado o self-government e na segunda prevaleceu o espírito de ordem da monarquia, simultâneo com a independência e que ainda assim levou um quarto de século para se impor.
As constituições revolucionariamente implantadas pretendiam sempre limitar as faculdades extremas da autoridade, em oposição ao despotismo tradicional e em defesa dos direitos naturais que, segundo a doutrina do contrato social, o indivíduo trazia como contribuição à coletividade. Raras vezes as constituições do Novo Mundo obedeceram a um desígnio ou mesmo a um instinto conservador. A aplicação dos princípios falseava porém freqüentemente o seu liberalismo e a conseqüência foi que as comunidades espanholas flutuaram, até se integrarem numa organização adequada, entre a tirania e a anarquia, expressões ambas de reação contra os moldes vazados na estrita legalidade.
O manifesto de 6 de agosto, dirigido pela regência do Rio de Janeiro aos governos e nações amigas, no intuito de "continuar a merecer-lhes a aprovação e estimação de que se faz cre4or o caráter brasileiro", obedece a essa corrente de idéias visível em toda a América, sobretudo na primeira metade do século decorrido. Estende-se o documento sobre a política tirânica de Portugal com relação à sua colônia, firmada em "leis de sangue ditadas por paixões, e sórdidos interesses".
Impostos, até o de capitação, proibições que envolviam castigos, monopólios odiosos, de tudo se servia a metrópole para expressar sua autoridade; por outro lado vedando ao Brasil o "mercado geral das nações" para só lhe permitir negociar com os seus tiranos, e inundando-o de "paxás desapiedados, magistrados corruptos e exames de agentes fiscais de toda a espécie que dilaceravam as entranhas da terra que os sustentava e enriquecia". Salvaram-na seus filhos, "fortes e animosos que a natureza tinha talhado para gigantes", e a terra como boa mãe por sua vez os alentava e envigorava para que lograssem desprezar todos os "obstáculos físicos e morais" levantados contra o seu progresso.
Pela pena de José Bonifácio evocava o príncipe a chegada de Dom João VI à sua corte americana e observava o acolhimento que o soberano e os nobres do reino receberam dos brasileiros, para o meio dos quais trouxeram novos abusos a acrescentar aos velhos, frutos aqueles "da imperícia, da imoralidade e do crime". O Brasil deixou Portugal levantar primeiro o grito de regeneração política da Monarquia; mas julgando os outros por si, não contava ser atraiçoado, como foi, nas suas esperanças e interesses.
Nesta altura entra o manifesto, a traços largos, mas incisivos, na análise da obra dissolvente das Cortes com relação ao ultramar, pouco lhe importando as desgraças que provocava e bastando-lhe proveitos momentâneos: "nada se lhe dando de cortar a árvore pela raiz contanto que, à semelhança dos selvagens da Luisiana, colhesse logo seus frutos, sequer uma vez somente". Nenhum libelo pode ser mais vigoroso e mais persuasivo do que esse, nem escrito com maior clareza e alcance.
Queixa-se o manifesto não somente da política ostensiva das Cortes, mas da sua política clandestina - a "corte de emissários mandados a desorientar o espírito público e a fomentar a desunião no Brasil. O que sobretudo espalhavam esses emissários era o intuito brasileiro de inteira separação e o desejo concomitante do príncipe de "reviver à antiga arbitrariedade", isto é, de restabelecer o governo absoluto, do qual só a união com as Cortes, a saber, a parceria constitucional poderia livrar o reino americano. Do manifesto se deduz expressamente que a queixa brasileira era toda do Congresso de Lisboa e não do monarca que ali estava nominalmente reinando. Neste ponto condiz esse documento com as cartas de Dom Pedro a Dom João VI, a última das quais, de 22 de setembro de 1822, sanciona a independência no sentido de desobediência às Cortes e não ao rei [9].
No manifesto redigido por José Bonifácio a nota é idêntica à da carta de Dom Pedro: o soberano era de fato um prisioneiro de Estado e suas ordens resultavam apócrifas merecendo tão pouco ser cumpridas quanto as que da sua prisão de Valença pudesse ter Fernando VII ditado aos seus domínios americanos. O manifesto completa porém a carta, que aliás precedeu, num ponto interessante e que de ordinário escapa à atenção do que volve os olhos para essa época, e é que a idéia de separação não deve ser contada como exclusivamente brasileira. Ela aparece igualmente como portuguesa, almejando-a no reino europeu duas classes de pessoas: as que o queriam ver entregue a si próprio e privado da solidariedade ultramarina, "para melhor darem ali garrote ao sistema constitucional", e as que por outro lado queriam uni-lo à Espanha, consumando a União Ibérica no fito de preservar o referido sistema liberal. Não admirava portanto "em Portugal escrever-se e assoalhar-se descaradamente, que aquele Reino utiliza com a perda do Brasil".
José Bonifácio fazia ainda referência a um tópico que no Brasil era antipático à facção intransigentemente independente, mas que era pessoalmente simpático a Dom Pedro: o de uma possível preservação dó Reino Unido com a supremacia do Brasil. As Cortes tinham porém feito tudo para tornar impossível essa solução. "Cegas pois de orgulho, ou arrastadas pela vingança e egoísmo, decidiram as Cortes com dois rasgos de pena uma questão de maior importância para a Grande Família Lusitana, estabelecendo, sem consultar a vontade geral dos portugueses de ambos os hemisférios, o assento da Monarquia em Portugal; como se essa mínima parte do território português, e a sua povoação estacionária e acanhada, devesse ser o centro político e comercial da nação inteira. Com efeito se convém a Estados espalhados, mas reunidos debaixo de um só chefe, que o princípio vital de seus movimentos e energia exista na central e poderosa da grande máquina social, para que o impulso se comunique a toda a periferia com a maior presteza e vigor, de certo o Brasil tinha o incontestável direito de ter dentro de si o assento do Poder Executivo".
Numa das cartas do príncipe regente a seu pai [10] aparece pela primeira vez uma sugestão que depois seria um dos motivos da desunião da família real portuguesa e da guerra civil entre absolutistas e constitucionais e que mostra que já naquele tempo preocupava o herdeiro da coroa a regulação futura da sucessão. "Peço a V. M. deixe vir o mano Miguel para cá, seja como for, porque ele é aqui muito estimado, e os brasileiros o querem ao pé de mim para me ajudar a servir no Brasil, e a seu tempo casar com a minha linda filha Maria".
A idéia oculta de Dom Pedro era não perder afinal a autoridade sobre nenhuma das seções da Monarquia. Nesse momento convinha sacrificar Portugal ao Brasil para não passar a seção mais importante a outras mãos ou a outro regime, com o que nem lucraria sua felicidade pois que, na frase desabusada de José Bonifácio no manifesto, "mudados os déspotas, continua o despotismo". O tempo viria de recobrar Portugal, subordinada embora a antiga metrópole à sua ex-colônia independente. Mesmo que isto não pudesse vir a dar-se pela legítima repulsão portuguesa de ocupar o segundo plano, mediante o casamento do tio com a sobrinha - Dom Miguel era o único infante da Casa de Bragança - tudo se arranjava satisfatoriamente: a prole de Dom Pedro reinaria nos dois hemisférios, como de fato veio a suceder a despeito do consórcio frustrado, até que em ambos os países se implantasse a República.
Dom Pedro fazia porém particular empenho no matrimônio de família, que a seu juízo simplificava muito a questão, tanto assim que ajuntava na carta a Dom João VI: "Espero que V. M. lhe dê licença, e lhe não queira cortar a sua fortuna futura, quando V. M. como Pai, deve por obrigação cristã, contribuir com todas as suas forças para a felicidade de seus filhos. V. M. conhece a razão, há de conceder-lhe a licença que eu, e o Brasil tão encarecidamente pedimos, pelo que há de mais sagrado".
Antes de romper os laços que prendiam o Reino Unido, justo título do desvanecimento paterno, exigia o decoro público do regente, não só o seu sentimento filial, que ele justificasse internacionalmente sua altitude, o que José Bonifácio fez com habilidade, definindo-a como a única possível para corresponder à confiança dos brasileiros e mesmo de toda a monarquia, desde o momento em que das Cortes de Lisboa "seria absurdo esperar medidas justas e úteis aos destinos do Brasil, e ao verdadeiro bem de toda a Nação Portuguesa". Nação significava a associação dos dois países, prestes a liquidar-se [11].
Perdido o Brasil, está perdida a Monarquia - rezava o manifesto, e para salvá-lo mister era que o príncipe regente se conservasse à sua frente, certo aliás de que não tardariam as Cortes de Lisboa em fornecer o motivo definitivo para a separação improrrogável.
A maçonaria entretanto não descansava. Antes de partirem seus emissários para as províncias com o fito de assegurarem a aclamação unânime de Dom Pedro como soberano do Brasil, cuidou-se da fórmula de juramento a remeter às câmaras municipais, que até então constituíam o único órgão legítimo da vontade popular, portanto da soberania nacional. Não era muito fácil conceber essa fórmula de um modo satisfatório, porque se os espíritos que tinham incubado a idéia de independência e que estavam levando a um termo feliz a gestação da nova nacionalidade não tinham posto ainda em conflito as suas preferências distintas, já se achavam contudo frente a frente aspirações, conjugadas com interesses, com tendências umas e outros a inconciliáveis.
Sabemos que não se estabelecera um acordo prévio sobre a forma de governo a ser escolhida: o acordo fizera-se tão somente sobre a base da união brasileira, mas como a regência encarnada no príncipe real fora o fator principal dessa consolidação política, era natural que a monarquia tivesse sido adotada como o instrumento necessário para a sua preservação. Por todos os motivos ela não podia porém deixar de ser uma Monarquia democrática, alguma coisa como um presidencialismo hereditário, derivando todavia desta tradição transplantada da função dinástica, um enfraquecimento de poder que o regime presidencial corrigia pela renovação periódica do mandato popular, ao passo que a monarquia tinha que buscar seu alento nas virtudes pessoais de cada imperante, com as quais ele justificava sua exaltada hierarquia.
Nalgumas províncias, Minas Gerais e Pernambuco entre outras, houvera desde começo receios de despotismo de um trono armado no Rio de Janeiro mais do que de dependência de um Portugal constitucional, e as desconfianças persistiam em forma latente depois de sopitada sua crise aguda, convindo dissipá-las e dar satisfação a anelos liberais que, por estarem em desacordo com o seu ambiente de cultura social, nem por isso eram menos instantes. Em atenção a eles se aventou que o Imperador jurasse cumprir a constituição que fosse elaborada pela Assembléia Constituinte, o que equivalia a colocar nesta a soberania nacional e conceder-lhe a primazia dos poderes.
Dizia-se ter isto também a vantagem que, se tal constituição não fosse tão radical quanto o sonhavam os ideólogos da democracia, não caberia a responsabilidade do fato ao monarca, que da sua elaboração não fora parte ativa. Não ocorreria portanto razão para queixas do regime e por outro lado mal podia suceder que a constituição não resultasse verdadeiramente liberal, ainda que dentro de termos razoáveis, refratários à demagogia, se iam proceder à sua feitura representantes da nação pela maior parte filiados na maçonaria. O juramento antecipado e incondicional de princípios cuja extensão e alcance se ignoravam, tinha contudo contra si a circunstância de ser uma violência exercida contra a consciência individual e mesmo de constituir um contra-senso inquinado de nulidade jurídica.
Aprovou-se entretanto a fórmula lembrada, que foi a que o padre Januário levou para Minas Gerais e que afinal por inconveniente se pretendeu retirar, quando o senado fluminense já a tinha oferecido a outras corporações municipais, dando azo a ser incriminado e com ele o Grande Oriente brasileiro de terem procurado um governo republicano, partindo o movimento da periferia para o centro. Por ocasião da discussão em sessão da câmara do Rio da cláusula primeiro debatida na assembléia maçônica e que continha em si o germe do futuro conflito entre o Imperador e a Assembléia Constituinte por ele finalmente dissolvida, deram-se demonstrações populares preparadas pelo Apostolado, pondo em ação arruaceiros de profissão que já eram de classe inferior aos padres Macamboa e Góes do ano anterior, chamando-se entre outros Miquelino e Porto Seguro. Apupados e apedrejados pelo poviléu os vereadores, seu presidente José Clemente Pereira escapou, todo coberto de lama, de pior tratamento, graças ao bolieiro da sua sege, o qual fustigou as bestas e conseguiu distanciar-se.
A luta estava travada em redor do Imperador, querendo os Andradas conservá-lo fiel aos princípios que depois se denominariam liberais dinásticos e querendo a facção avançada peá-lo com formas virtualmente republicanas, começando por se comprometer a aceitar qualquer lei orgânica que lhe fosse imposta. Era a repetição do que em Portugal se passara com a intitulada regeneração. A maçonaria servia admiravelmente de meio a essa facção ultra-liberal para agir sobre a imaginação de Dom Pedro, sendo sua atmosfera de mistério propícia como nenhuma outra às intrigas desse gênero. O príncipe ficara radiante com a idéia de ser grão-mestre, embora às custas de José Bonifácio, e conta Drummond que no regresso de São Paulo, depois do Ipiranga, o jovem soberano - que já o era pela sua decisão e pela sagração popular - vinha delirante sob a impressão de contentamento que lhe dera aquela singular honraria, a qual ninguém de resto lhe poderia disputar se, como ele parecia pensar, a maçonaria não tinha outro objetivo senão trabalhar pela causa da independência do Brasil.
O constitucionalismo de Dom Pedro sempre foi o de Cortes deliberativas, não apenas consultivas; mas nunca foi o de uma Assembléia soberana delegando a função executiva num monarca irresponsável, servido por ministros responsáveis para com a Nação dos atos políticos e administrativos praticados sob a sanção real. Na concepção democrática do sistema a soberania cabia em última análise ao povo: na sua concepção pessoal ela cabia ao Rei e à Nação. "O Rei e a Nação sempre estão reunidos e nunca separados escrevia Dom Pedro a Dom João VI [12] a propósito do seu título de defensor perpétuo, em virtude do qual também lhe cabia defender o pai, não somente como filho, mas como súdito - pois que, quem defende o rei defende a Nação".
Oportunamente surgiria a idéia de um quarto poder - o poder modelador - ao qual Dom Pedro se apegaria estritamente para garantia das prerrogativas que ele julgava essenciais à majestade e à independência da coroa e que lhe seriam concedidas em troca do privilégio exclusivo de que abria mão, quer por sobreposição da autoridade de uma constituinte eleita, quer por dádiva magnânima como era de sua inclinação.
A sua concepção de um príncipe reinante não era pois a do simples manequim constitucional que advogavam os que consentiam em conservar a monarquia como uma ficção que tranqüilizasse ou um rótulo que não assustasse. "Um príncipe, escrevia ele, deve ser sempre o primeiro a morrer pela pátria": deve ser portanto um chefe, não um subordinado; "deve trabalhar mais que ninguém pela felicidade dela ; porque os príncipes são os que mais gozam da felicidade da Nação e é por isso que eles devem esforçar-se por bem merecer as riquezas que consomem, e as homenagens que recebem dos outros cidadãos".
No misto de idéias tradicionais e de idéias modernas que no seu cérebro se associavam muito mais do que contendiam, Dom Pedro concedia grande importância às câmaras municipais, células na verdade do organismo político da nação, e deu constantemente provas de preferir entender-se com elas do que com as câmaras legislativas, de certo porque estas, transformando a essência das antigas Cortes que reviviam, avocavam uma primazia sobre a coroa que não era rigorosamente histórica. Os homens bons dos conselhos procedentes dos forais representavam mercês da realeza e o Terceiro Estado, que eles encarnavam, não só não pretendia antepor-se aos outros, como deixava pairar sobre todos a Coroa a que ajudavam na sua tarefa construtora.
Notas
editar- ↑ Compunham esta regência o arcebispo da Bahia como presidente, Luís Antônio Rebelo da Silva, Manuel Antônio de Carvalho, Sebastião José Xavier Botelho e João de Sousa Pacheco como vogais. Os secretários conjuntamente nomeados eram Francisco José Vieira, do reino e fazenda; Joaquim José de Queiroz, da justiça e cultura e o brigadeiro José de Sousa e Sampaio, da guerra e marinha. Eram pessoas moderadas c ilustradas e não régulos como os qualifica Melo Moraes.
- ↑ Armitage, ob. cit.
- ↑ Ofício de 10 de agosto.
- ↑ Arquivo do Departamento do Estado de Washington
- ↑ Ofício a Metternich de 19 de agosto de 1822
- ↑ O competente historiador americano Bernard Moses considera esta a razão essencial da independência (Spain's Declining Power in South America, 1919).
- ↑ Arquivo do Departamento de Estado de Washington.
- ↑ "Firme nestes inabaláveis princípios, digo (tomando a Deus por testemunha e ao mundo inteiro) a essa cafua sanguinária, que eu, como Príncipe Regente do Reino do Brasil e seu defensor perpétuo, hei por bem declarar todos os decretos preteritos dessas facciosas, horrorosas, maquiavélicas, desorganizadoras, hediondas e pestíferas cortes, que ainda não mandei executar, e todos os mais que fizerem para o Brasil, nulos, irritos, inexequíveis, e como tais com um veto absoluto, que é sustentado pelos brasileiros todos, que, unidos a mim, me ajudam a dizer: De Portugal nada, nada; não queremos nada.
- ↑ "Firme nestes inabaláveis princípios, digo (tomando a Deus por testemunha e ao mundo inteiro) a essa cafua sanguinária, que eu, como Príncipe Regente do Reino do Brasil e seu defensor perpétuo, hei por bem declarar todos os decretos preteritos dessas facciosas, horrorosas, maquiavélicas, desorganizadoras, hediondas e pestíferas cortes, que ainda não mandei executar, e todos os mais que fizerem para o Brasil, nulos, irritos, inexequíveis, e como tais com um veto absoluto, que é sustentado pelos brasileiros todos, que, unidos a mim, me ajudam a dizer: De Portugal nada, nada; não queremos nada.
- ↑ Carta de 19 de junho de 1822.
- ↑ "Eu seria ingrato aos brasileiros - seria perjuro às minhas promessas - e indigno do nome de príncipe real do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, se obrasse de outro modo. Mas protesta ao mesmo tempo perante Deus, e à face de todas as Nações amigas e aliadas, que não desejo cortar os laços de união e fraternidade, que devem fazer de toda a nação portuguesa um só todo político bem organizado. Protesto igualmente que, salva a devida e justa reunião de todas as partes da Monarquia debaixo de um só Rei, como Chefe Supremo do Poder Executivo de toda a Nação, Hei de defender os legítimos direitos e a Constituição futura do Brasil, que espero seja boa e prudente, com todas as Minhas forças, e a custa do Meu próprio sangue, se assim for necessário.
- ↑ Carta de 21 de maio de 1822.