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vezes batem a testa, a boca e o coração. E como eu, rindo, lhe invejava aquela intimidade com um «homem de túnica verde e de mitra persa»:

—É um ulemá de Bagdá —disse Fradique — duma casta antiga, superiormente inteligente... Uma das personalidades mais finas e mais sedutoras que encontrei na Pérsia.

Então, com a familiaridade que se ia entre nós acentuando, perguntei a Fradique o que o detivera assim na Pérsia um ano inteiro e um dia como nos contos de fadas. E Fradique, com toda a singeleza, confessou que se demorara tanto nas margens do Eufrates, por se achar casualmente ligado a um movimento religioso que, desde 1849, tomava na Pérsia um desenvolvimento quase triunfal, e que se chamava o Babismo. Atraído para essa nova seita, por curiosidade crítica, para observar como nasce e se funda uma religião, chegara pouco a pouco a ganhar pelo Babismo um interesse militante—não por admiração da doutrina, mas por veneração dos apóstolos. O Babismo (contou-me ele, seguindo por uma viela mais solitária e favorável as confidências), tivera por iniciador certo Mirza-Mohamed, um desses Messias que cada dia surgem na incessante fermentação religiosa do Oriente, onde a religião é a ocupação suprema e querida da vida. Tendo conhecido os Evangelhos Cristãos por contacto com os missionários; iniciado na pura tradição mosaísta pelos judeus do Hiraz; sabedor profundo do guebrismo, a velha religião nacional