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perava-me quando mandava que esperasse; dormia quando não lhe dizia nada. Macia, silenciosa, boa. Para comprar-lhe um vestido, tinha de zangar-me. Ela própria os transformava. Fazíamos economias. Dei-lhe certa Vez um anel. Pois chorou!...

— E o Eusébio?

— Ah! é verdade! O Eusébio... Enquanto existiu, manteve na nossa união um ar de delírio. Imagine você que o Eusébio ia para o teatro com a pequena. O teatro inteiro censurava Etelvina. Etelvina amimava a filha como se amima a filha de um conhecido, e não falava ao Eusébio. Levava de capricho. O pobre diabo exibia de mais a desgraça. Deu mesmo para o fim em ir cear com a pequena, que poderia ter nêsse tempo pouco mais de um ano. Ficava bêbedo debruçado sobre as mesas, enquanto a criancinha dormia nas banquetas. Um horror!

— Isso não os envergonhava?

Exasperava-nos. Era uma raiva... Quando o Eusébio, doente do peito, subiu para a Serra da Estrêla, deixando a filha com a avó, é que notei a normalização da nossa vida. Acordávamos tarde. Almoçávamos. Ela saía para o ensaio. Eu às vezes ia levá-la. De outras ia conversar aos cafés. Voltávamos a jantar. Ríamos, contávamo-nos mutuamente o nosso dia. Era bom. Depois ela ia para o teatro e eu aparecia a buscá-la, indo mesmo cear com camaradas. Passámos assim ano e meio. Devia ser por toda a vida! Ao cabo dessa maravilha de temporada, recebi uma carta anónima, assegurando que Etelvina entrava em francos colóquios com um jovem cómico, o Justino.

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— Desagradável...

— Não sei se era verdade. No momento perdi a cabeça, lembrei o Eusébio, a minha felicidade. Corri ao teatro. A um canto Etelvina justamente conversava com o Justino. Atirei-me vomitando impropérios e ali mesmo espanquei o cómico. Houve pânico, gritaria, sangue, portas fechadas. Toda a companhia berrava, ameaçando-me. Eu sacudia furioso a bengala. Só Etelvina, branca e impassível, assistia à scena. Fiquei louco de ira. Agarreia-a pelo braço, levei-a aos encontrões até à rua, atirei-a num trem