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A ILUSTRE CASA DE RAMIRES

O Bento, velho de face rapada e morena, com um lindo cabello branco todo encarapinhado, muito limpo, muito fresco na sua jaqueta de ganga, entrára vagarosamente, segurando a infusa d’agua quente.

— Oh Bento, ouve lá! Tu não encontraste na mala que eu trouxe de Lisboa, ou no caixote, um frasco de vidro com um pó branco? É um remedio inglez que me deu o Sr. Dr. Mattos... Tem um rotulo em inglez, com um nome inglez, não sei quê, fruit salt... Quer dizer sal de fructas...

O Bento cravou no soalho os olhos, que depois cerrou, meditando. Sim, no quarto de lavar, em cima do bahú vermelho, ficára um frasco com pó, embrulhado num pergaminho antigo como os do Archivo.

— É esse! declarou Gonçalo. Eu precisava em Lisboa uns documentos por causa d’aquelle malvado fôro de Praga. E por engano, na balburdia, levo do Archivo um pergaminho perfeitamente inutil! Vae buscar o rolo... Mas tem cuidado com o frasco!

O Bento, cuidadoso, sempre lento, ainda enfiou os botões d’agatha nos punhos da camisa do Sr. Doutor, e desdobrou sobre a cama, para elle vestir, a quinzena, as calças bem vincadas, de cheviote leve. E Gonçalo, retomado pela idéa de artigos para os Annaes, folheava, rente á janella, a Historia da Administração Publica em Portugal, quando Bento