Tendo-a detido arbitrariamente e adoptado como filha, não mais a podia deixar sahir de Portugal, salvo se a casasse antes. Nunca tratou comtudo seriamente de tal solução. Desprezou todas as combinações que a Rainha D. Leonor fazia de longe, para dar estado á filha. Póde-se provar, em face de documentos officiaes (correspondencia particular entre D. João III, D. Catharina e a Infanta de um lado, o imperador e D. Leonor do outro), que El-Rei procurou sempre adiar e estorvar os projectos de casamento offerecidos, e que o imperador seguiu o mesmo systema, embora com menos responsabilidade. Ambos haviam ao pé de si outras duas Marias, seu proprio sangue e seu amor. A essas é que consorciaram primeiro. É o que podemos e devemos allegar a favor. [1]
No tratado de Madrid, depois da batalha de Pavia (14 de Janeiro de 1526), ficou ajustado o casamento da viuva de D. Manoel com o rei galanteador Francisco I «para que a paz entre a Hespanha e França fosse duravel». A rainha D. Leonor, que venerava com amor profundo e respeitoso a Carlos V, cedeu ás suas instancias, cheia de esperanças illusorias, pondo uma unica condição: que ao mesmo tempo se concertasse o casamento do Dauphin com a Infanta D. Maria, o qual se effectuaria logo que os dois principes tivessem doze annos completos, isto é em 1533.
Nenhum historiador indica os motivos que impediram o cumprimento d'esta clausula; póde-se presumir, porém, que foram as novas guerras entre os dois monarchas rivaes que obstaram ao enlace contractado. O que é certo é que o Dauphin viveu até 1536, morrendo na edade de 19 annos, quando a Infanta completára os 15.
Desde então, os embaixadores das potencias estrangeiras começaram a encarecer em cartas e relatorios as virtudes e prendas da Infanta, não esquecendo, bem se vê, o lado positivo. O de Veneza informava do modo seguinte:
Que havia em Portugal uma Princeza, por extremo rica, porque com o dote que tinha de 400:000 escudos havia ganhado nas Indias 300:000, não fallando nos 200.000 do dote de sua mãe, hypothecado nos Condados de Lorena, afóra joias e custosissimas roupas! [2]
E assim por deante.
Ainda em 1571 o secretario do cardeal Alexandrino chamava-a a princesa mais rica da christandade, referindo-se a suas innumeraveis joias, e milhão de bens patrimoniaes, que ia gastando com os pobres.
Para prevenir as sollicitações dos pretendentes, os tres paes, que não se cansavam de, á porfia, attestar palavrosamente o seu profundo
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