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ennegrecendo-lhe as paredes, revestindo-lhe de hervas os telhados, de musgo as padieiras e as junturas de pedra, e povoando-lhe de morcegos e de corujas os buracos dos muros. Emfim a superstição popular terminára a obra fazendo divagar as almas do outro mundo por aquellas salas e corredores vazios, e nas ruas d’aquella quinta, entregue á natureza.

A defuncta morgada, que não se recolhera á aldeia senão depois de ter gosado na capital de todos os esplendores da vida das cidades, e brilhando nas mais concorridas e elegantes salas do seu tempo, gosava n’esta pequena terra, onde passára o resto da vida, de uma fama de espirito forte, que em grande parte concorrera para generalisar a opinião de que a sua alma andava ainda penando por cá.

Contavam-se entre o povo anecdotas absurdas, em relação aos annos da mocidade da morgada. A imaginação popular fazia a biographia d’aquella senhora, colorindo-a com as tintas maravilhosas com que costuma phantasiar a vida dos grandes centros, de que vive afastada.

A morgada, que só renunciou ao mundo quando os espelhos começaram a falar-lhe da vaidade das glorias que repousam nos encantos da belleza, passou, como succede muitas vezes, de um extremo a outro extremo, e da vida elegante ás práticas de devoção.

Nos Cannaviaes ouvia missa todos os dias, confessava-se todas as semanas, commungava todos os mezes, sem comtudo resignar absolutamente os habitos de elegancia de que já fizera uma necessidade natural. Trajava sempre com distincção e esmero, e ao corrente das modas.

Tudo isto e as proprias devoções da morgada, acabaram por convencer o povo de que havia grandes culpas no passado d’ella, as quaes procurava remir á fôrça de missas. Dizia-se que a morte a viera tomar antes das contas saldadas, e que por isso a sua alma voltava á terra penando.