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Já se vê que o logar era para apavorar as imaginações timidas, e de noite pouca gente da aldeia gostava de passar por lá.

Henrique depois de ter dicto em Alvapenha que ia passar a noite ao Mosteiro, d’onde voltaria tarde, saiu mais cêdo do que a hora devida, e fazendo obra pelas informações da morgadinha, dirigiu-se para os Cannaviaes para escolher posição d’onde pudesse, sem ser visto, observar Christina, não tendo ainda resolvido se lhe appareceria ou se a deixaria imperturbada na sua piedosa tarefa.

A noite fizera-se escura e ameaçava chuva.

Henrique, alumiando-se com uma lanterna de furta-fogo, já um pouco habituado aos caminhos estreitos e escabrosos do campo, atravessou a aldeia, examinando com attenção todos os objectos que lhe deviam servir de indicadores da estrada.

Pouco passava das dez horas, quando se achou em frente de uma casa que por apparencia, julgou ser a demandada propriedade.

Era uma casa escura, crivada de pequenas janellas e peitoril, tendo a um lado um alto portão da quinta, do outro a capella, cuja porta Henrique achou ainda fechada.

O sussurro dos cannaviaes agitados pelo vento era uma garantia de haver acertado.

Principiavam a cair algumas grandes gottas de chuva e a escuridão a fazer receiar grandes aguaceiros.

Henrique achou prudente procurar um abrigo onde pudesse resguardar-se. N’este intento approximou-se do portão. Com grande espanto seu, achou-o aberto.

Já teria chegado Christina?... Enganar-se-ia elle na casa?... Estaria habitada a quinta?

Estas tres explicações do inesperado facto debatiam-se-lhe no espirito, sem que elle soubesse qual adoptar.

Transpoz o portão e entrou na quinta. Nenhuma apparencia de vida.