Página:As Caçadas de Pedrinho (1ª edição).pdf/52

capaz de tudo, os meninos e as velhas sossegaram um pouco mais.

A razão de tia Nastacia haver desistido das pernas de páu era que não acreditava muito no tal assalto das onças. “Isso ha de ser imaginação dessas crianças”, refletia ela de si para si. “Os diabretes vivem com a cabeça quente e inventam coisas para atormentar os mais velhos. Não acredito”.

Dona Benta igualmente não acreditou — no principio. Depois, lembrando-se de outras coisas inda mais espantosas que já haviam acontecido, achou melhor acreditar.

— Pelo sim, pelo não, acredito, disse ela para a negra. Coisas tão espantosas têm acontecido neste sitio que, “por via das duvidas”, acho melhor acreditar.

— Qual, nada, sinhá! insistiu a negra. Onde já se viu onça andar em bando a atacar casa de gente? Estou com setenta anos e nunca ouvi falar de semelhante ação.

— Nem eu. Mas lembre-se, Nastacia, que tambem nunca vimos contar de nenhuma boneca que falasse, nem de nenhum visconde de sabugo que agisse tal qual uma gentinha — e aí estão a Emilia e o visconde de Sabugosa.

— Lá isso é, resmungou a preta, pendurando o beiço.

— Se isso é, concluiu dona Benta, como vái você arranjar-se amanhã, se as onças vierem mesmo?

— Como vou me arranjar? repetiu tia Nastacia coçando a cabeça. Não sei. Francamente não sei. Na hora veremos...