MONTEIRO LOBATO
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— Que pena não ter portado um minuto para tomar café comnosco! Elie sempre me visita e gosto muito delle.

Narizinho, que já conhecia Peter Pan, fez varias perguntas a respeito desse extraordinario "menino que jamais quiz ser gente grande" e de sua inseparavel companheira, a fada Sininho. E ainda estava a ouvir historias delle, quando Fazdeconta deu um berro de desespero, apontando para estranha figura que acabava de pular a cerca do quintal, com uma enorme faca de matar mulher na mão.

— Feche os olhos, Narizinho! gritou elle. Barba Azul vem vindo!...

A menina, para salvar-se, fechou os olhos com quanta força teve...


VII — O ALFINETE


E salvou-se. Quando reabriu os olhos viu que estava outra vez no pomar, na beira do ribeirão, sentada na "sua raiz" com Fazdeconta ao collo, mudo e morto como antes. Sacudiu-o, como se fosse um relogio que houvesse parado, mas o boneco não andou. Parece que havia acabado a corda delle.

— Que pena! murmurou Narizinho. "Mudei de estado" outra vez. Estou agora no estado de todos os dias — um estado tão sem graça...

E voltou correndo para casa porque era quasi noite.

— Vóvó! gritou ao entrar. Fazdeconta viveu mais de uma hora, e conversou commigo, e me acompanhou até ao Paiz das Maravilhas, onde móra Capinha Vermelha. E vi as nymphas dansando, e um fauno tocando flauta, e quebrei a flauta delle, e sahiu de dentro uma nuvem de vespas, e uma dellas era fada, e...

— Páre, páre, menina! exclamou dona Benta tapando os ouvidos. Você me deixa atordoada. Não estou entendendo coisa nenhuma.