— Que é que elle sabe? perguntou a voz, arrumando com outra casca de goiaba na cartola do visconde.
Todos no sitio tinham-se acostumado a considerar o visconde um grande sabio, mas na realidade ninguem sabia o que elle sabia. Porisso se atrapalharam com a pergunta. Mas Emilia, que não se atrapalhava com coisa nenhuma, disse logo, toda espevitada:
— Elle sabe embolorar muito bem. Fica todo verdinho por fóra, quando quer. E' doutor em bolor.
Desta vez quem se atrapalhou foi a voz, que com certeza nunca tinha ouvido falar em bolor.
De repente — pluf! barulho de alguem que pula de arvore abaixo. Era a voz que havia descido, plantando-se no meio delles.
— Estamos na hora, disse. Temos de partir antes que o sol nasça. Que é do mappa?
Pedrinho tirou o mappa do bolso e apresentou-o. A voz pegou-o, abriu-o e ficou a ver.
Narizinho arregalara os olhos. Aquelle mappa que se abria no ar como que por si mesmo, e ficava parado, pareceu-lhe uma coisa extraordinaria. O mysterioso menino era invisivel, mas não tornava invisivel os objectos que pegava. Isso deu immediatamente uma idéa a Pedrinho.
— Lembrei-me duma coisa, disse elle. Como é muito enjoado lidar com um companheiro de viagem que a gente não pode ver, proponho que traga uma penna no chapéu. Pela penna saberemos onde você está.
— Seria optima a idéa, respondeu a voz, se eu usasse chapéu. Mas não uso coisa nenhuma sobre o corpo, senão todos me perceberiam e de nada valeria ser invisivel.
— Ai que vergonha! exclamou Emilia tapando a cara com as mãos. Que não dirá dona Benta quando souber que estamos em companhia de um ente que não usa roupas?
— Deixe de ser idiota, Emilia, ralhou Narizinho. Você não entende nada de creaturas invisiveis.