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O PÓ DE PIRLIMPIMPIM

o casaco e sacando as botas. Será um crime deixarmos morrer um burro que fala.

Entraram os dois pelo mar a dentro, nadando a largas braçadas em direcção do naufrago.

— Segurem-no pelo rabo e puxem! berrava Emilia da praia. Mas não puixem com muita força, senão arrancam-lhe o rabo!...

Assim fizeram os salvadores. Um agarrou o burro pelo rabo e o outro pela orelha, e o vieram puxando para terra.

Estava salvo o precioso burro falante, unico exemplar conhecido! Mas em que estado!... Ou por medo, ou por ter passado tanto tempo no ar, meio enforcado pelo cabresto, ou por ter bebido agua demais, o caso era que nem falar podia. Apenas suspirava uns suspiros de cortar o coração da gente.

— Agua! gritou dona Benta. Deem-lhe agua!

Emilia, muito lampeira, pegou logo uma concha marinha, das que abundavam por alli, encheu-a dagua do mar e despejou-a na bocca do burro.

— Que burrice é essa, Emilia? gritou Narizinho tomando-lhe a concha. Pois não vê que o coitado está morrendo de tanta agua do mar que bebeu? Agua quer dizer agua doce, boba...

— Pello de cão se cura com a mordedura do proprio cão! respondeu a boneca, trocando as bolas dum dito que tia Nastacia usava muito.

E não é que deu certo? Aquella agua na concha enjoou o burro de tal maneira, que elle começou a vomitar todo o oceano que havia engulido. Melhorou immediatamente. Sentou-se na areia, com as patas da frente espichadas, tal qual uma esphinge do Egypto.

— Está melhorzinho? veio perguntar dona Benta, passando-lhe a mão pela cara.