necessário que a rapariga andasse à noite em ponta de pés pela casa, tateando a escuridão para ir ter com o seu homem. Agora dormiam à vontade, seguros de sua independência, com as portas bem fechadas por dentro.

E só se despregavam, do lado um do outro, quando tinham que abandonar o quarto. Então, cada um se servia da porta competente: Amélia tomava a da varanda e Amâncio a da sala de visitas!

Não podiam desejar melhor!

Melhor, bem certo, para o descanso do corpo e repouso do espírito; não, porém, para garantia do amor, essa estranha função psicológica que só alimenta as suas raízes nos sobressaltos e no perigo. Tamanha segurança e tamanha liberdade de ação deviam fatalmente levantar a ponta de tédio, cujo novelo existe, mais ou menos escondido, no fundo de todas as coisas.

Não vinha longe a saciedade; Amâncio já lhe ouvia o bocejar. Iam-se-lhe pouco a pouco amortecendo os primitivos arrebatamentos do desejo; os dois tinham-se já frouxamente, sem lumes de entusiasmo, sem os esforçadores auxílios da imaginação. Assuntos práticos, positivos agora se lhes intercalavam nas carícias, puxando-os grosseiramente à calma realidade da vida.

Amelinha já lhe não surgia no quarto com aquele trêfego ruçar-se de pomba assustada, o que lhe enchia as feições e os movimentos de uma graça tão maliciosa e provocadora; agora se apresentava com um ar muito tranquilo, de casada, a arrastar os chinelos, o roupão desabotoado e solto num farto abandono de alcova.

Despia-se defronte de Amâncio, coçando negligentemente as partes do corpo que estiveram comprimidas durante o dia, como a cinta, o lugar das ligas e dos canos das botinas. Despenteava-se ali mesmo, ao lado da cama do rapaz, sacundindo o cabelo com ambas as mãos, num