a disfarçar, a fingir que era o que exigiam brutalmente que ele fosse.

Nunca lhe deram liberdade de espécie alguma: Se lhe vinha uma idéia própria e desejava pô-la em prática, perguntavam-lhe "a quem vira ele fazer semelhante asneira".

Convenceram-mo de que só devemos praticar aquilo que outros já praticaram. Opunham-lhe sempre o exemplo das pessoas mais velhas; exigiam que ele procedesse com o mesmo discernimento de que dispunham seus pais.

E os rebentões da individualidade, e o que pudesse haver de original no seu caráter e na sua inteligência, tudo se foi mirrando e falecendo, como os renovos de uma planta que regassem diariamente com água morna.

À mesa devia ter a sisudez de um homem. Se lhe apetecia rir, cantar, conversar, gritavam-lhe logo: "Tenha modo, menino! Esteja quieto! comporte-se!"

E Amâncio, com medo da bordoada, fazia-se grave, e cada vez ia-se tornando mais hipócrita e reservado. Sabia afetar seriedade, quando tinha vontade de rir; sabia mostrar-se alegre, quando estava triste; calar-se, tendo alguma recriminação a fazer; e, na igreja, ao lado da família, sabia fingir que rezava e sabia aguentar por mais de uma hora a máscara de um devoto.

Como o pai o queria inocente e dócil, ele afetava grande toleima, fazia-se um ingênuo, muito admirado com as coisas mais simples.

— É uma menina!... dizia a mãe, convicta — Amancinho tem já dez anos e conserva a candura de um anjo!

Vasconcelos nunca o puxava para junto de si, nem conversava com ele, o interrogava; e quando a infeliz criança, justamente na idade em que a inteligência