E não havia dinheiro para nenhuma dessas coisas!

— Um inferno! um verdadeiro inferno! — Os moradores da Rua do Resende há que tempos que não pingavam vintém; — Damião estava já pelos cabelos para arriar a carga: "Não podia mais aturar semelhante corja!" dizia e contava até que um dos inquilinos lhe tentara chegar a roupa ao pelo por questões de aluguéis.

E Coqueiro viu arrastar-se todo aquele mau dia na mesma inferneira.

À noite, foi preciso acender velas em substituição do gás suprimido. Amélia não comera desde a véspera e queixava-se agora de muitas dores na cabeça, náuseas, tonturas de febre e um fastio mortal; apareciam-lhe por todo o corpo pequenas manchas roxas. Mme. Brizard só abria a boca para fazer novas recriminações e praguejar; na sua cólera chegara a dar alguns tabefes no filho, e este rabujava a um canto, embesourado e casmurro.

— Antes morresse! antes, mil vezes antes! repisava Coqueiro, sentindo-se esmagar debaixo daquele desmoronamento. — Que faria agora de uma irmã prostituída, e de uma mulher desesperada?!...

E as horas arrastavam-se pesadas como cadeias de ferro. A casa mal esclarecida tinha uma tristeza lúgubre de igreja deserta.

Afinal, Mme. Brizard foi para a cama com o filho, Amélia parecia mais tranquila; só Coqueiro velava, só ele, com o seu desespero a triturá-lo por dentro.

Não podia sossegar um minuto — era deixar-se ir consumindo pelo sofrimento, até que a dor cansasse de doer e os tais bichos negros do coração lhe comessem o último bocado de carniça. Sentia, porém, uma espécie de volúpia pungente em reler as cartas anônimas que lhe enviaram durante o dia; encolerizava-se com isso,