Embaixo, na área da casa, uma ilhoa, de braços nus, a cabeça embrulhada em um lenço de ramagens, lavava a um tanque de cimento romano; um homem, em mangas de camisa, varria as pedras do chão, cantarolando com os dentes cerrados, para não deixar cair a ponta do cigarro. Numa janela, um sujeito, de óculos azuis, areava os dentes e com a boca atirava duchas sobre um papagaio, cuja gaiola pousava no balcão. Dentro de um cercado cacarejavam galinhas, mariscando na terra; e o homem do lixo entrava e saía, familiarmente, com o seu gigo às costas.

Um relógio da vizinhança bateu seis horas.

Amâncio reparou que estava com muita sede, mas não descobria a talha d'água. Afinal encontrou-a, num sótão que havia ao lado do quarto e onde só se entrava vergando o corpo.

Bebeu até à saciedade.

Depois lavou o rosto e a boca. E com a idéia de sair antes que os mais acordassem, vestiu-se apressado, contou o dinheiro que lhe restava, lamentando interiormente o que na véspera esbanjara; viu no chão uma escova de fato, apanhou-a, escovou a roupa, e, todo cautela e ponta de pé, abriu a porta e ganhou a escada.

Entre o primeiro e o segundo andar encontrou uma rapariguita de alguns dezesseis anos, que subia com dois copos de leite, um em cada mão, fazendo mil esforços para não os entornar. Ao ver Amâncio ela emperrou, cosendo-se à parede, a fim de lhe dar passagem, e olhou-o de esguelha, com medo de afastar a vista dos copos.

Era bonitinha, corada, os cabelos castanhos apanhados na nuca. Parecia portuguesa.

Amâncio, ao passar por ela, estacou também, a fitá-la. De repente lançou-lhe as mãos.