como por milagre; o que, aliás, não impediu que tivesse daí a pouco de voltar à cama, debaixo de um novo e mais formidável carregamento que o ia varrendo ao cemitério. Foram esses os três anos de sezões a que se referia, quando pela primeira vez falou ao Campos.

E Amâncio, quanto mais rememorava tudo isso, quanto mais remexia no cinzeiro do passado, tanto mais impacientes lhes rosnavam os sentidos e tanto mais desabrida lhe vinha a necessidade de gozar, de viver em liberdade, de recuperar o tempo que levou sopeado e preso.

— Enfim! concluiu ele erguendo-se distraído e abandonando o café — a casa do Campos não me convém! de forma alguma!

Mas a idéia de Hortênsia, que, para se apresentar só esperava o termo daquelas considerações, invadiu-lhe o espírito e foi a pouco e pouco se estendendo e se esticando por todo ele, até ocupá-lo inteiramente com a sua imagem branca e palpitante, como uma bela mulher que desperta e, entre voluptuosos espreguiçamentos, alonga pela cama os seus membros ainda entorpecidos de sono.

E ele, quando deu por si, estava a fazer conjecturas sobre o amor de Hortênsia:

— Seria ardente ou calmo? Meigo ou arrebatador? Que atitude tomaria a bela mulher nos momentos supremos de ventura? Quais seriam as suas palavras, as frases do seu delírio?...

E, aguilhoado pelos sentidos, perdia-se em cálculos infames, em degradantes suposições; tentando, embalde, adivinhar-lhe os pensamentos, penetrar-lhe nos escaninhos do coração e devassar-lhe todos os segredos do corpo.

— Oh! Como seria?...