lhe traiu o elance, porque senti no meu peito a doce pressão de seu talhe.

Repeliu-me logo. Ouvindo o ai que soltaram seus lábios, arranquei o lenço arrebatadamente, e surpreendi seu olhar... Que olhar, meu Deus!... A voragem de uma alma revolta pela paixão, e abrindo-se para tragar a vítima!

Mas foi tão instantâneo, que eu não posso afirmar que vi. Já ela se tinha afastado bruscamente dilacerando entre os dedos os renovos das plantas, que sua mão trêmula encontrava na passagem. O capuz lhe descera, deixando a cabeça exposta à chuva e à brisa cortante.

Depois de algumas voltas pelo jardim voltou calma, serena e risonha; dirigiu-se à porta, indicando-me com um aceno gracioso que a seguisse. Na sala de jantar onde entramos, estava uma cafeteira; ela encheu uma xícara e bebeu dois ou três goles frios e sem açúcar.

— Ah! Aqui é o gabinete, onde se estuda! disse parando no lumiar. — Pode-se entrar?

Eu tinha vergonha da minha modesta habitação, que não era digna daquela honra. Confuso, acompanhava quase como um autômato a ela, que vagava de um para outro lado, naturalmente, sem o menor vexame. Meu gabinete de trabalho era nesse tempo muito pobre; o que havia de melhor estava na cidade. Emília correu a estante com os olhos, lendo o título das poucas obras literárias, com esse tom afetuoso com que saudamos antigos amigos.

— O senhor nunca fez versos?

— Quem é que não os