tecia sahir o pai, a casa, se era silenciosa, tomava aspecto tumular, e então nem um som sahia d’alli de dentro.
Ora, um dia em que todos estavão em casa, aconteceu andar o poeta e mais o cão a passear no jardim que confinava com a chacarinha do hortelão.
O poeta ia scismando, mais ermo de si do que nunca, quando deu por falta do cão; Diogenes tinha passado para a horta do hortelão, attrahido não sei porque; o poeta chamou por elle, approximou-se da pequena cerca e vio o vizinho occupado em amimar Diogenes.
— Ah!
O hortelão voltou-se e deu com o poeta.
— Tinha saltado para cá...
— É um travesso. Fez-lhe mal ás plantações?
— Oh! não!
— Diogenes!
O cão saltou a cerca e foi fazer festas ao dono. O poeta e o hortelão comprimentarão-se e nada mais se passou n’aquelle dia entre ambos.
Tal foi o primeiro encontro entre os dous vizinhos.
Mas este encontro trouxe outros, e a conformidade da vida e dos sentimentos dos dous velhos completou uma intimidade que dentro de pouco tempo se tornou perfeita.
Era o primeiro a quem o velho hortelão tinha aberto completamente a sua alma e a sua vida. Ainda assim, só o fez depois que uma longa observação trouxe-lhe em resultado o conhecimento da existencia retirada do poeta.
Só tarde soube este que o vizinho tinha uma filha, uma linda e infeliz filha, no dizer do proprio pai. Isto equivale a dizer que, apezar da mesma victoria alcançada pelo poeta no espírito do hortelão, ainda não tinha conseguido transpôr a soleira da casa d’este.
Assim era. As conversas dos dous velhos, nas horas vagas, erão em casa do poeta, sendo o operario o mais solicitado para essas praticas mansas e intimas.
É necessario, para commodidade da narração, dar a cada um dos personagens d’esta historia um nome. Será o do poeta: David; o do hortelão: Vicente; o da filha deste: Emilia.
David, portanto, convidava Vicente muitas vezes para ir matar com elle algumas horas aborrecidas depois do trabalho. Vicente accedia a esses desejos, ao principio por sympathia e conformidade da existencia e idade, depois por ver a conformidade dos sentimentos e do profundo desgosto que ambos parecião ter, finalmente por motivo de uma verdadeira e profunda amizade.