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Sou Feiticeiro e a Noite me contempla...
E trago ao peito a flôr d'onde se exhala
O sombrio perfume do Crepusculo!
Por isso, o meu espirito alevanta
Seu cantico de sombra á luz do dia!...
E matei o Silencio, e vi meu corpo
Tinto do sangue eterno da Harmonia!
E, n'um grande delirio, sem parar,
Eu ando; e me persegue o seu Phantasma,
—Essa Voz, tão chimerica, a falar,
Esse corporeo Som que me domina!...


«Bemdita sejas tu, ó sempiterna
E sagrada Paisagem Portuguesa,
Que o mundo concebeu todo encantado
No seu primeiro sonho de beleza!
Bemdita sejas tu, por todo o sempre,
E o teu ventre que um novo Deus encerra,
Ó unica Paisagem onde o Céu
Se casa intimamente com a Terra!


«Pinheiraes da tristeza! Ó poentes de oiro!
E a voz do Mar além dos horizontes,
D'onde a nevoa caminha, em si trazendo
Fogo vivo do céu, agua das fontes!
Ó longes indecisos, nevoentos,
Que a magica penumbra da tardinha
Povôa de phantasmas agoirentos,
De murmurios e vozes misteriosas...
Ó fumo dos casaes que aos céus eleva
Esperanças, Saudades e Alegrias

Que nas noites de inverno, quando neva,