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este direito aos sucessores do autor falecido. O que ocorre, de fato, é a atribuição da legitimidade para pleitear o direito do autor em juízo. Após sua morte, caso venha terceiro a atribuir para si autoria de obra alheia, poderão os sucessores do verdadeiro autor defendê-lo. Nada mais, nada menos. Inconcebível, assim, crer que a autoria poderia ser herdada, como ocorria com o Código Civil brasileiro de 1916[1].

O mais protegido dos direitos morais nos parece também ser verdadeiro direito de personalidade, devendo subsistir perpetuamente, inclusive por questões de ordem pública. É fundamental à sociedade conservar o nome do autor vinculado às suas obras por diversos motivos: conhecimento da verdadeira autoria, atribuição de responsabilidade e vedação de enriquecimento sem causa por “furto intelectual”[2].

O inciso I, ao determinar que é direito moral do autor o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra, tem como finalidade conferir ao autor o direito de impedir que terceiro atribua a si obra criada por aquele. Já o inciso II estabelece, como consequência do inciso anterior, que o autor poderá exigir que seu nome conste da obra por ele criada. Cremos assim que, nos incisos que se completam, existe um verdadeiro direito de personalidade: o direito ao nome. A rigor, o direito ao nome existe apenas no inciso II. No entanto, uma vez que o direito de apor o nome a determinada obra apenas existe em função do direito de paternidade (reivindicar sua autoria), daremos aos incisos I e II

tratamento  uniforme.

A respeito do direito ao nome, Adriano de Cupis afirma[3]:

 

O direito ao nome compreende o poder de gozo do nome, isto é, o poder de usar o nome a fim de gozar daquela identidade pessoal para realização da qual ele serve. Portanto, o titular do nome tem direito a usá-lo em todos os momentos da sua vida, em todos os atos da vida pública e privada. Desta forma, não podem terceiros impedir o exercício deste poder do uso ou contestá-lo, devendo designar o indivíduo pelo seu nome e não por outro, de maneira a não prejudicar a função que lhe é própria.


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69 O absurdo de se admitir a transferência de autoria vigorou até o século XX em determinados ordenamentos jurídicos, como o brasileiro. O Código Civil de 1916 previa, em seu art. 667, que “é suscetível de cessão o direito, que assiste ao autor, de ligar o nome a todos os seus produtos intelectuais”. Rodrigo Moraes afirma que “[n]o dizer e Carlos Alberto Bittar, o referido artigo 667 consistiu na ‘maior aberração' do Código Civil de 1916. Sílvio Rodrigues afirmou que se tratou de ‘aleijão' colocado no diploma civil. Segundo Antônio Chaves, o dispositivo configurava ‘flagrante equívoco', que recebeu repulsa geral da maioria dos civilistas brasileiros da época”. MORAES, Rodrigo. Os Direitos Morais do Autor — Repersonalizando o Direito Autoral. Cit.; p. 64.

70 “Mas acredito que nós podemos também deixar de fora — por não apresentar excessivos problemas do ponto de vista dogmático — a violação do direito moral de reconhecimento da autoria. A omissão do nome do autor, por exemplo, em qualquer ato de uso da obra, constitui uma violação tão elementar que não é necessário recorrer a considerações judiciosas sobre a personalidade do autor, para que a pena seja imposta”. Tradução livre do autor. No original, lê-se que: “[p]ero creo que podemor dejar también de fuera — por no presentar excessivos problemas desde el punto de vista dogmático — la violación del derecho moral al reconocimiento de la condición de autor. La omisión del nombre del autor, pongamos por caso, en cualquier acto de utilización de la obra, constituye una violación tan elemental que no es necesario acudir a sesudas consideraciones acerca de la personalidad del autor para que la sanción sea impuesta”. PÉREZ-GÓMEZ, Antonio Castán. Dominio Público, Derecho Moral y Derecho a la Personalidad Pretérita. Cit.; p. 220.

71 CUPIS, Adriano de. Os Direitos da Personalidade. Cit.; pp. 194-195.