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(e) vedação ao ingresso no domínio privado de obra em domínio público

Em abril, [Carlos] Imperial lançou um compacto simples de Célia e Celma com as canções “O ratinho”, feita em cima de Topo Gigio, um camundongo importado da Itália que aparecia na TV Globo ao lado de Agildo Ribeiro, e “O coelhinho”, uma canção de domínio público que Célia e Celma ensinavam para suas alunas quando eram professoras em Ubá. Os arranjos eram de Leonardo Bruno, também parceiro de Carlos em “O ratinho”. Foi a partir desse trabalho que Imperial começou a prestar mais atenção em canções de domínio público. Na Odeon, quis saber para quem iriam os direitos autorais, e lhe responderam que iriam para a própria gravadora. Correu e registrou “O coelhinho” como sua, além de todas as canções sem autor que foi encontrando. O caso que acabou ganhando os jornais foi o registro de “Meu limão, meu limoeiro”, o que provocou uma saraivada de críticas. Mas ele nem se abalou:

— Comigo é assim: mulher e música, se não tiver dono, eu vou lá e apanho. Em casa, Dona Zezé o repreendia:

— Mas, Carlos Eduardo, como você tem coragem de dizer que essa música é tua? Meu filho, cansei de te embalar cantando ela quando você era recém-nascido.

 

O episódio anedótico acima transcrito é narrado por Denílson Monteiro em “Dez! Nota Dez! Eu sou Carlos Imperial[1], biografia do polêmico artista, falecido em 1992. Na história, não causa estranheza apenas o fato de Carlos Imperial ter registrado indevidamente canções de autores desconhecidos, mas igualmente o fato de tal registro de ter sido aceito, quer pelo órgão competente, quer pela sociedade. Em rápida pesquisa realizada na internet, pode-se perceber que “Meu limão, meu limoeiro” tem sua autoria frequentemente atribuída a José Carlos Burle e Carlos Imperial[2].

Essa é uma forma inadmissível de se apropriar de obras em domínio público. A proteção das obras em domínio público pelo Estado tem inclusive, entre seus fundamentos, impedir a violação do direito de paternidade quando o autor é conhecido ou a apropriação de obra de autor desconhecido. No entanto, não é a única, tampouco a mais comum, das maneiras de fazer obra em domínio público reingressar, em alguma medida, no domínio privado.

Em alguns casos, é a própria lei que autoriza o reingresso de obras em domínio público no domínio privado, ao estender prazos de proteção. Em outros casos, busca-se proteger obras criadas a partir de outras em domínio público, sendo que a originalidade



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às propostas. Em abril de 2011, o Ministério da Cultura, já sob a gestão de novo titular (apontado pela presidente eleita Dilma Rousseff), apresentou nova proposta de redação, a partir dos comentários compilados. No momento, aguarda-se a redação do texto final a ser submetido ao Congresso Nacional. Em conformidade com a proposta atual do Ministério da Cultura, o art. 24, §2º, passaria a vigorar com a seguinte redação: “Compete aos entes federativos, aos órgãos e às entidades relacionadas no art. 5o da Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985, a defesa da integridade e autoria da obra pertencente ao domínio público”.

109 MONTEIRO, Denílson. Dez! Nota Dez! Eu Sou Carlos Imperial. São Paulo: Matrix, 2008; p. 228.

110 A autoria consta também da base de dados do ECAD, podendo ser verificada em http://www.ecadnet.org.br/ principal.aspx. Acesso em 04 de setembro de 2010.