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das obras novas é discutível, a ponto de se indagar se deveriam mesmo ser protegidas ou se conferir proteção a elas consistiria em permitir uma reapropriação de obras em domínio público[1]. Finalmente, há casos em que a apropriação da obra se dá simplesmente por haver um direito de propriedade sobre o suporte onde ela se encontra ou um direito conexo sobre o modo de sua emissão. Vejamos cada um dos casos.

De acordo com a lei autoral brasileira anterior, o prazo de proteção era de 60 anos contados da morte do autor[2]. Quando do surgimento da LDA, em 1998, fazia 2 anos que as obras de Fernando Pessoa, morto em 1935, haviam entrado em domínio público no Brasil.

Com a prorrogação do prazo de proteção para 70 anos, seria de se indagar se Fernando Pessoa deveria voltar ao domínio privado. A LDA se ocupou da matéria em um de seus últimos artigos, o 112, para deixar inequívoco que se a determinada obra estivesse em domínio público, a LDA não a devolveria ao domínio privado: “se uma obra, em consequência de ter expirado o prazo de proteção que lhe era anteriormente reconhecido pelo § 2º do art. 42 da Lei nº. 5.988, de 14 de dezembro de 1973, caiu no domínio público, não terá o prazo de proteção dos direitos patrimoniais ampliado por força do art. 41 desta Lei”.

Conforme visto no capítulo anterior, o destino do mesmo Fernando Pessoa foi diferente em Portugal. Uma vez que a Europa, de modo geral, teve que harmonizar seus prazos de proteção em meados da década de 1990, deu-se uma grande reprivatização da cultura, já que muitos países europeus contavam com prazos menores do que o determinado pela diretiva europeia: 70 anos a partir da morte do autor. Por isso, obras de autores como Fernando Pessoa e James Joyce, que ainda não haviam entrado em domínio público na Alemanha (cujo direito autoral serviu de base para a estipulação do novo prazo harmonizado), voltaram ao domínio privado em seus países de origem e em todo o território europeu onde a proteção já não mais existisse[3].

Recentemente, no caso Golan vs. Gonzales, discutiu-se se obras estrangeiras já em domínio público nos Estados Unidos poderiam voltar ao domínio privado. A controvérsia se mostrava relevante porque envolvia obras cinematográficas notórias, como “Metrópolis” (Fritz Lang, 1927) e “O Terceiro Homem” (Carol Reed, 1949), além de músicas de Igor Stravinsky e textos de H. G. Welles.


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111 A respeito da originalidade das obras e criticando a proteção conferida a obras sem qualquer contribuição reflexivo-transformadora por parte de seus autores, ver GRAU-KUNTZ, Karin. Domínio Público e Direito de Autor. Cit..

112 Lei 5.988/73, art. 42: Os direitos patrimoniais do autor perduram por toda sua vida. § 1° — Os filhos, os pais, ou o cônjuge gozarão vitaliciamente dos direitos patrimoniais do autor que se lhes forem transmitidos por sucessão mortis causa. § 2° — Os demais sucessores do autor gozarão dos direitos patrimoniais que este lhe transmitir pelo período de sessenta anos, a contar do 1° de janeiro do ano subsequente ao de seu falecimento. § 3° — Aplica-se às obras póstumas o prazo de proteção a que aludem os parágrafos procedentes.

113 Fernando Pessoa volta ao domínio público. Disponível em http://jpn.icicom.up.pt/2005/11/30/fernando_pessoa_ volta_ao_dominio_publico.html. Acesso em 07 de agosto de 2010.