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à apreciação do judiciário brasileiro. Não deixa de ser, entretanto, relevante matéria prática, especialmente diante das possibilidades oferecidas pela  internet.

A mesma controvérsia acerca da reprodução fotográfica de obra em domínio público nos leva a outro campo, o das edições de livros. É bem verdade que sempre que alguém produz uma obra derivada a partir de outra obra já em domínio público, o autor da obra derivada fará jus à proteção autoral, nos termos do art. 14 da LDA, contanto que estejam presentes os requisitos de proteção. Por isso é que, neste particular, exerce papel fundamental a originalidade. A obra derivada apenas poderá ser protegida se for, ela própria, original[1].

Uma vez em domínio público, a obra literária poderá ser modificada, adaptada e transformada, tendo como resultado, inclusive, versões inusitadas como “Razão e Sensibilidade e Zumbis”. Mas quanto de originalidade é necessário para que o autor da obra nova garanta sobre ela direitos autorais?

Diversos casos foram julgados nos Estados Unidos em que a proteção à obra derivada foi recusada, exatamente por carecer de originalidade. São exemplos a correção ortográfica e gramatical em texto em domínio público e a tradução de 850 palavras e 45 frases curtas do Árabe para o Inglês[2]. Já em Israel, conforme visto, a tradução (ou decifração, termo que parece mais adequado ao caso) de um curto texto milenar foi declarada protegida por direitos autorais, apesar de todo o interesse acadêmico, científico e cultural atrelado ao texto.

O primeiro exemplo é particularmente relevante em razão das sucessivas edições de obras clássicas lançadas no mercado. A adição de novos elementos às obras (prefácios, posfácios, ilustrações) tem como resultado a proteção autoral a tais elementos, mas não ao texto original. Assim, uma nova edição de “Os Lusíadas” ou de qualquer obra de José de Alencar ou de Machado de Assis não estaria protegida por direitos autorais a menos que contasse com estes novos elementos. Nesse caso, a proteção recairia exclusivamente sobre os elementos novos. Por melhor que seja a edição, por mais apurada e sofisticada



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117 Sobre o tema, afirma José Carlos Costa Netto: “[d]esses três elementos [pertencer ao domínio das letras, das artes ou das ciências; ter originalidade; achar-se no período de proteção fixado pela lei], o que mais tem ocupado a atenção dos juristas concerne à originalidade, que deve ser tomada como uma característica respeitante à forma de exteriorização da ideia, e não em relação à ideia em si, que, como visto, não é considerada como objeto dos direitos de autor. A expressão utilizada por Henry Desbois é a ‘originalidade da forma' (...)”.NETTO, José Carlos Costa. Direito Autoral no Brasil. São Paulo: Ed. FTD, 1998; pp. 56-57. Ressaltam ainda a importância da originalidade ou criatividade, entre outros: POLI, Leonardo Macedo. Direito Autoral — Parte Geral. Belo Horizonte: Del Rey, 2008;

p. 112; MENEZES, Elisângela Dias. Curso de Direito Autoral. Cit.; p. 45; AFONSO, Otávio. Direito Autoral

Conceitos Essenciais. Barueri: Manole, 2009; p. 14; PIMENTA, Eduardo. Princípios de Direitos Autorais

Livro I. Cit.; p. 69; ABRÃO, Eliane Y.. Direitos de Autor e Direitos Conexos. Cit.; p. 95; FRAGOSO, João Henrique da Rocha. Direito Autoral — Da Antiguidade à Internet. Cit.; p. 115; ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. Cit.; p. 50. Criticando o conceito genérico e abrangente de originalidade, LANGE, David. Recognizing the Public Domain. Law and Contemporary Problems — vol. 44; p. 157. Disponível em http://www. heinonline.org/HOL/NotSubscribed?collection=journals&bad_coll=lcpcf. Acesso em 12 de setembro de 2010.

118 FISHMAN, Stephen. The Public Domain — How to Find & Use Copyright-Free Writings, Music, Art & More. Cit.; p. 72. Respectivamente, Grove Press, Inc. v. Collectors Publication, Inc., 264 F. Supp. 603 (C.D. Cal. 1967) e Signo Trading Int'l, Ltd. v. Gordon, 535 F. Supp. 363 (N. D. Cal. 1981).