Página:O livro de Esopo fabulario português medieval.pdf/140

logo, que Burley se inspirou, o que contudo se torna evidente deante d’elle é que da expressão a delphis = a Delphis um copista medieval, por distracção ou ignorancia, fez adelphus, tomando, no manuscrito de que se serviu, -is por -us; alem d’isso juntou a preposição a ao nome seguinte[1]. De modo que adelphus ou Adelphus, respectivamente em romanço Adelpho ou Adelfo, é na origem palavra fantastica, — ghost-word dos Ingleses —, mas temos de acceitá-la como sobrenome de Esopo no Liber de Burley, e portanto no nosso Fabulario (e tambem no manuscrito escurialense de que acima fallei)[2]. — Postoque o nome de Esopo, quer em grego, quer em latim, Αἴσωπος, Aesopus, tenha σ ou s, apparece-nos no Fabulario com x. Essa orthographia é usada em varios mss. medievaes: por exemplo, em mss. da Inglaterra, liber Exopi, Exopi fabulae[3]; da Italia liber Exopi[4]. Alem d’isso a orthographia latina do nome do fabulista variou muito: Ysopus (em romanço Ysopo, Ysopet), Hesopus, Ensopus, Esopus, Hysopo, etc., umas vezes por influencia da orthographia das lingoas romanicas, outras por falsas ideias etymologicas, etc.; mas d’isso não tenho de me occupar, pois que as unicas fórmas que apparecem no nosso texto são Exopo, no prologo, e Exopy (genetivo latino), no fim das fabulas. — L. 4) Antiochia. Com quanto muitas tenham sido as localidades dadas por patria de Esopo, Amorium, Cotyaeum, Mesembria, Samos, Sardes[5], não sei que jamais Antiochia fosse considerada como tal. O Liber de vita et moribus philosophorum, que, segundo ha pouco mostrei, foi conhecido do autor do Fabulario, diz a este respeito, como vimos, «Esopus .. fuit .. grecus, de civitate Attica».

  1. Acêrca da facilidade com que -us e -is se confundiam em geral nos manuscritos da idade-media, diz Lindsay: «En capitales et en onciales, aussi bien qu’en minuscules, la ligature de -us ressemble beaucoup á -is. Dans l’ancienne écriture minuscule, on emploie parfois la même abréviation pour l’un que pour l’autre», — vid. Introduction à la critique des textes latins, Paris 1898, p. 100. Da juncção da preposição ao respectivo caso os exemplos são tão numerosos, que nem valia a pena insistir nisto; todavia cfr. o que diz o mesmo Lindsay ao fallar da escrita minuscula da idade-media: «Les petits mots tels que les prépositions .. sont habituellement joints aux mots voisins plus longs», — ibidem, p. 19.
  2. No copista que commetteu o erro da troca póde ter influido a ideia de que Adelpho ou Adelfo era realmente nome e appellido noutras circunstancias, nas quaes provém da citada palavra grega. Ha mesmo um bispo S. Adelpho, que se venera em 20 de Agosto. Adelphus é tambem cognomem romano.
  3. Hervieux, Les fabulistes latins, I, 576 (2.ª ed. ?).
  4. Hervieux, ob. cit., pp. 591, 592.
  5. Cfr. De Vit, Onomasticon, s. v. «Aesopus».