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As ondas tinham um murmurio indistincto. Nenhum rumor perturbava o resvalar magestoso daquella massa. De terra via-se o que se passava á bordo como se lá estivesse.

O Cashmere roçou quasi pela rocha.

O timoneiro estava no leme, um grumette trepava aos ovens, alguns passageiros, encostados á amurada, contemplavam a serenidade do tempo, o capitão fumava. Mas não era nada disso o que Gilliatt contemplava.

Havia no tombadilho um lugar cheio de sol. Era para alli que elle olhava. Alli* estavam Ebeneser e Deruchette. Estavam assentados debaixo daquella luz, elle juntinho della. Contrahiam-se graciosamente ao lado um do outro, como dous passaros que se aquecem a um raio do meio dia, n’um desses bancos cobertos de umi assento alcatroado que os navios bem preparados offerecem aos viajantes, e nos quaes costuma ler-se, quando o navio é inglez: For ladies only. A cabeça de Deruchette cahia sobre o hombro de Ebeneser, o braço de Ebeneser estava por traz da cintura de Deruchette, tinham as mãos aggarradas uma á outra e os dedos entrelaçados nos dedos. As differenças de um anjo a outro mostravam-se claramente naquelles dous delicados rostos feitos de innocencia. Um era mais virginal, o outro mais sideral. Era expressivo aquelle casto abraço, que encerrava o hymenêo e o pudor. Aquelle banco era já uma alcova e quasi um ninho. Ao mesmo tempo, era uma gloria; a doce gloria do amor fugindo n’uma nuvem.

O silencio era celeste.

O olhar de Ebeneser agradecia e contemplava; moviam-se os labios de Deruchette; e nesse silencio delicioso,