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BRANDÃO, Jacyntho Lins. Sîn-lēqi-unninni..., p. 125-160

Tire ela a roupa e abra seu sexo.*
[144] Ele a verá e chegará junto dela,*
Estranhá-lo-á seu rebanho, ao que cresceu com ele.*
[146] Ao conselho do pai ----


conforme George, como “a prostituta por excelência”. Saliente-se que esse nome aparece como próprio em outros documentos (cf. GBGE, p. 148). A propósito da nomeação de Shámhat por Enkídu como um importante recurso narratológico, ver Worthington, 2011, p. 406-409.

Desde a descrição feita por Heródoto da prostituição nos templos da Babilônia (cf. Histórias 1, 199), muito se tem especulado sobre o estatuto dessas hierodulas. Pelo que hoje se sabe, parece que as harimtu constituíam uma das classes de mulheres ligadas aos templos (cf. Lerner, 1985, p. 244, provavelmente a mais baixa dentre todas, constituída por “filhas de escravas” que ficavam “sob a supervisão de um funcionário de nível inferior”). O texto não diz nada sobre a condição de Shámhat, mas George anota que, “enquanto um centro do culto a Ishtar, deusa do amor sexual, Úruk era uma cidade bem conhecida pelo número e beleza de suas prostitutas”, muitas delas empregadas no templo de Nínsun e da própria Ishtar; uma vez que ela conduz Enkídu ao templo de Ánu e desta última deusa, é de supor-se que estivesse ligada justamente a ele (GBGE, p. 148).

Escolhi um termo menos usual e já um tanto arcaico para traduzir harimtu, ou seja, “meretriz”, a fim de sugerir de algum modo que não se trata de uma prostituta no sentido comum (eu quis evitar, igualmente, a palavra grega “hierodula”).

[Verso 143] Cf. SEG, p. 113, “na iconografia mesopotâmica são muito frequentes as representações de uma figura feminina que abre seu manto e deixa descoberto seu sexo; trata-se do ato de provocação típico de uma prostituta”.

[Verso 144] Como já observei, o verbo țehû (chegar, aproximar-se) é usado frequentemente no sentido da obtenção de contato sexual.

[Verso 145] Segundo alguns comentadores, o fato de Enkídu, por ter tido relações sexuais com Shámhat, passar a ser estranhado pelos animais com os quais vivia até então sugere algum tipo de zoofilia (assim interpreta SEG, p. 113: “a atração sexual por Shámhat destruirá as relações zoofílicas de Enkídu”). Nada no texto explicita isso, mas não se trata de algo absurdo a ser simplesmente descartado.

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